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Conselho Municipal de Assistência Social condena “Lei Marcão” de combate à fome

Entidade também pediu retorno do Cheque Cidadão, do restaurante popular e da passagem social

Campos
Por Redação
2 de abril de 2018 - 17h39

Marcão é autor da lei criticada pelo Conselho (Foto: Silvana Rust)

O Diário Oficial do município traz, nesta segunda-feira (02), uma nota de repúdio do Conselho Municipal de Assistência Social com duras críticas à polêmica lei 8.816/2018, de autoria do vereador Marcão Gomes (Rede), que ficou mais conhecida como “Lei Marcão”. O dispositivo legal, já aprovado pela Câmara de Vereadores e sancionado pelo prefeito Rafael Diniz (PHS), permite que empresas vencedoras de licitações doem ao Fundo Municipal de Assistência Social (FMAS) montante equivalente a 1% do valor líquido do contrato firmado com a Prefeitura de Campos. Ao criticar a lei, o Conselho usou palavras como “atraso”, “assistencialista” e “clientelista”. Ainda no texto, a entidade pediu retorno imediato do Cheque Cidadão, do restaurante popular e da passagem social.

“O projeto de lei (8.816/2018) do vereador Marcão é uma ‘obra prima’ do atraso, do ridículo e da pobreza. O seu entendimento acerca desta política nos remete ao retorno de práticas assistencialistas, clientelistas, imediatistas e arcaicas, desconsiderando a concepção de cidadania e justiça social preconizada pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas), disse a nota, assinada pela presidente do Conselho, Elma Coelho Nunes Sizenando, em 16 de março, mas publicada no D.O desta segunda.

Ainda de acordo com a nota, a lei foi criada, aprovada e publicada à revelia dos princípios e fundamentos que devem nortear a gestão da política pública de assistência social numa perspectiva democrática e de controle social com participação popular. “Reafirmamos, portanto, que justiça social NUNCA foi feita com distribuição de cesta básica”, pontuou a nota.

Para o Conselho há necessidade de retorno imediato e ampliação do acesso aos programas sociais como Cheque Cidadão, restaurante popular e passagem social. Na avaliação da entidade, o fim de tais programas “impactou diretamente na população trabalhadora que vive o pauperismo e a miséria nesse município, causando enormes dificuldades de mobilidade a essas famílias para acesso à educação, trabalho, saúde, assim como restrições e, muitas vezes, falta de alimentos e condições dignas de vida”.

Após ser alvo de denúncia de corrupção, que culminou na Operação Chequinho, o programa de transferência direta de renda Cheque Cidadão foi suspenso em 2017. Pouco mais de 12.600 famílias incluídas no programa antes de junho de 2016 recebiam o benefício. De junho até a suspensão do Cheque Cidadão, as inscrições aumentaram em cerca de 18 mil inscrições, totalizando mais de 30 mil beneficiários. Já a passagem deixou de ser R$ 1 em julho do ano passado. Em outubro do ano passado, a Prefeitura deixou de subsidiar parte da tarifa, que passou a ser cobrada integralmente. Sobre o restaurante popular, o local foi fechado em 9 de junho de 2017.

Marcão colocou-se à disposição do Conselho para debater o assunto e explicou que o objetivo da lei foi criar uma nova fonte de financiamento para execução de benefícios eventuais que já existem na Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano. “Importante deixar claro a todos que, diferente daqueles que gostam de explorar a pobreza para comprar votos com programas sociais – e que estão sendo processados e condenados como fruto da Operação Chequinho – não há no projeto qualquer relação com eleição. Por isso, ele só será implementado no ano de 2019, após as eleições”, ressaltou o vereador em nota.

Leia a nota da Prefeitura de Campos na íntegra: 

A Prefeitura de Campos informa que vem cumprindo seu papel de analisar as leis propostas pelo Poder Legislativo e sancioná-las, quando forem relevantes para a população e viáveis para a administração pública. A lei só entrará em vigor, após o pleito eleitoral de 2018 — observação, inclusive feita pelo próprio autor da Lei, o vereador Marcão. “Não podemos e não iremos, de forma alguma, confundir assistência social com abuso eleitoreiro, o que já ocorreu em nossa cidade. Jamais utilizaremos qualquer projeto social para tirar proveito eleitoral, por isso a aplicação da lei será somente depois do processo eleitoral, em 2019”, explica o procurador geral do município, José Paes Neto, ressaltando que, para a aplicação, a lei precisa ser regulamentada pelo Poder Executivo.

O objetivo é retomar os programas sociais e expandir a política de assistência no município. Os programas foram, momentaneamente, suspensos em virtude da inviabilidade financeira da prefeitura. A secretaria de Desenvolvimento Humano e Social criou o Programa Cartão Cooperação, que é uma adequação ao Cheque Cidadão, e segue critérios estabelecidos para adaptação à realidade de limitações financeiras municipais e atendimento às famílias que realmente necessitarem do benefício.

Leia também: Rafael Diniz sanciona lei de Marcão que cria nova forma de financiar cestas básicas

Leia também: Lei Marcão com cheiro populista

Leia a nota do Conselho na íntegra:

MOÇÃO DE REPÚDIO AO PROJETO DE LEI 8.816/2018

O Conselho Municipal de Assistência Social vem a público manifestar o seu repúdio à condução dos processos de implementação de projetos de lei que vem sendo elaborados e aprovados pelo legislativo, representado pela Câmara de Vereadores, deste município à revelia dos princípios e fundamentos que devem nortear a gestão da Política Pública de Assistência Social numa perspectiva democrática e de controle social com participação popular. Esses projetos descaracterizam drasticamente os preceitos assegurados pela Constituição Federal de 1988 no que se refere às diretrizes e deliberações relativas à Seguridade Social brasileira, assim como descaracterizam as regulamentações da referida Política Pública de Assistência Social. O projeto de lei (8.816/2018) do vereador Marcão é uma “obra prima” do atraso, do ridículo e da pobreza. O seu entendimento acerca desta política nos remete ao retorno de práticas assistencialistas, clientelistas, imediatistas e arcaicas, desconsiderando a concepção de cidadania e justiça social preconizada pelo SUAS. É imperativo que o processo decisório e deliberativo, relativo a toda e qualquer ação, programa, projeto, serviço e benefício de assistência social se submeta à lógica do controle social, conforme previsto nas legislações (CF. 1988, 8.742/1993, 12.435/2011). A constituição de uma sociedade livre, justa e democrática pressupõe o reconhecimento da legitimidade de todos os interessados na construção do processo decisório e no constante exercício do controle sobre as decisões tomadas. Reafirmamos, portanto, que justiça social NUNCA foi feita com distribuição de cesta básica; Reafirmamos, ainda, que a população demandatária desta Política merece respeito e dignidade, e que as suas necessidades de sobrevivência vão muito além da aquisição de cesta básica e cobertores. Também, ressaltamos a necessidade de retorno imediato e ampliação do acesso aos programas historicamente existentes no município, tais como, O Programa de transferência Direta de Renda “Cheque Cidadão”, restaurante popular e passagem social. Entendemos que o fim desses programas impactou diretamente na população trabalhadora que vive o pauperismo e a miséria nesse município, causando enormes dificuldades de mobilidade a essas famílias para acesso à educação, trabalho, saúde, assim como restrições e, muitas vezes, falta de alimentos e condições dignas de vida. Nesse sentido, REPUDIAMOS a forma arbitrária como vem sendo conduzido o Sistema Único de Assistência Social na municipalidade e todas as formas autoritárias, autocráticas e opressivas de gestão. E exigimos que a lei nº 8.816/2018 NÃO seja sancionada pelo executivo municipal, respeitando aos preceitos constitucionais democráticos e o controle social.

Campos dos Goytacazes, 16 de março de 2018.

Elma Coelho Nunes Sizenando

Leia a nota do vereador Marcão na íntegra:
“O projeto não institui nenhuma política social nova, portanto, não tem o intuito de resolver problemas sociais com a entrega de cestas básicas. O objetivo é criar uma nova fonte de financiamento para execução de benefícios eventuais que já existem no âmbito da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano. Os recursos destinados ao FMAS serão utilizados prioritariamente para distribuição de cestas básicas, distribuição que já existe há anos.

Importante deixar claro a todos que, diferente daqueles que gostam de explorar a pobreza para comprar votos com programas sociais – e que estão sendo processados e condenados como fruto da Operação Chequinho – não há no projeto qualquer relação com eleição. Por isso, ele só será implementado no ano de 2019, após as eleições. Além disso, o projeto prevê a participação do Conselho Municipal de Assistência Social na regulamentação do mesmo, além de estabelecer que os critérios para execução dos benefícios eventuais custeados com recursos provenientes da Lei deverão atender as diretrizes estabelecidas pela Lei Orgânica da Assistência Social e pelo Plano Nacional de Assistência Social, não havendo qualquer subjetividade capaz de direcionar a quem quer que seja o benefício eventualmente fornecido. Também consta no projeto a obrigatoriedade de publicação de relatório trimestral referente aos valores arrecadados e benefícios distribuídos, em total atendimento ao princípio da transparência.

Outro ponto importante é que a doação trata-se de uma liberalidade, onde a adesão é completamente voluntária. Não há obrigatoriedade. Inclusive, existem solicitações de diversos vereadores de outros municípios que também querem implementar a lei. Por fim, tenho certeza de que os profissionais que atuam no âmbito da assistência social e o próprio Conselho não são contra a entrada de uma nova fonte de financiamento no âmbito do Fundo Municipal de Assistência Social (isso sim seria um grande atraso). Coloco-me à disposição do Conselho para o debate de ideias e melhorias que possam sugerir”.