O neurocirurgião Fabrício Zacarias conversou sobre os principais tipos de dor que chegam ao consultório, as formas de diagnóstico e os recursos disponíveis para o tratamento. Ele destacou a importância de diferenciar a dor aguda da crônica, o impacto da doença na qualidade de vida e os avanços recentes em terapias minimamente invasivas, capazes de devolver bem-estar a pacientes que sofrem com dor persistente. Este e outros temas são destacados na reportagem especial do J3News, “Dor aguda e crônica: quando procurar ajuda” (leia aqui).
Quais são os principais tipos de dor que o senhor atende em sua prática clínica?
Existem algumas formas de classificar a dor, sendo que uma das principais é em relação ao tempo. No meu dia a dia é bem comum atendimentos de casos tanto de dor aguda como de dor crônica. Quanto à localização, a dor lombar é o principal sintoma que leva os pacientes a nos procurar.
Como diferenciar dor aguda de dor crônica, e por que essa distinção é importante para o tratamento?
A dor aguda é aquela de duração até 3 meses, e a dor crônica tem duração acima desse período. É importante diferenciar os dois tipos porque a dor aguda geralmente acontece por uma lesão como uma inflamação, infecção, um trauma, e é considerada um alerta que algo aconteceu subitamente e deve ser resolvido, com medicações, cirurgias ou outras terapias.
Quando a dor se torna crônica, a lesão que iniciou há alguns meses provavelmente já foi sanada, mas ocorreram alterações nos nervos da região onde houve a lesão inicial. Essas alterações modificam a forma do envio do estímulo doloroso ao cérebro, prolongando exageradamente a percepção da dor. A harmonia neurológica daquela região foi desfigurada, portanto os tratamentos devem ser específicos para essa anomalia.
Existem sinais de alerta que indicam que uma dor deve ser investigada imediatamente por um especialista?
As pessoas que têm dor prolongada, que não melhora com tratamentos convencionais, ou apresentam piora progressiva, ou dor que incapacite a rotina, devem ficar alertas e procurar um especialista.
Quais exames ou avaliações são mais utilizados para identificar a causa da dor?
A primeira investigação deve ser durante a consulta médica, procurando entender o tipo de dor, como começou, seguido de um bom exame físico para termos mais detalhes do quadro e aí sim sabermos qual ou quais exames complementares serão necessários para ajudar a fechar o diagnóstico e selecionar o melhor tratamento.
Como o histórico do paciente influencia na escolha do tratamento?
Saber a rotina do paciente, alimentação, sono, atividades que realiza, assim como se é acometido por outras doenças, nos ajuda muito na escolha do tratamento, que passa também por orientações sobre o seu estilo de vida e no tratamento necessário das outras enfermidades. Por exemplo, um quadro de depressão geralmente torna o tratamento da dor muito mais desafiador e não pode passar despercebido.
Quais são os métodos mais eficazes para o tratamento da dor crônica atualmente?
Na maioria dos casos, inicialmente, a dor crônica deve ser tratada com mudança de hábitos, terapias físicas e medicações específicas voltadas para esse fim.
Quando o tratamento cirúrgico é indicado em casos de dor?
Na dor aguda, quando há indicação de cirurgia, ela vai tratar a enfermidade que está gerando a dor. Já na dor crônica, os procedimentos intervencionistas vão agir naquela forma alterada do nervo receber e transmitir o estímulo doloroso, quando o tratamento conservador com medicações e outras terapias realizadas não resolveram.
Que avanços recentes em neurocirurgia têm ajudado no controle da dor?
A neurocirurgia tem evoluído significativamente no tratamento da dor no campo da neurocirurgia funcional. Com técnicas minimamente invasivas como bloqueios ou infiltrações dos nervos, procedimentos por radiofrequência e pequenas cirurgias como implante de eletrodos, é possível modular (modificar) a atividade do sistema nervoso que foi comprometida e aliviar a dor, especialmente nos casos de pacientes que não respondem a tratamentos convencionais.
Como a medicina intervencionista, como bloqueios nervosos ou neuromodulação, se encaixa no tratamento da dor?
Os bloqueios, ou infiltrações nos nervos, são procedimentos que fazemos até mesmo no consultório, com medicações como anestésicos locais, para bloquear imediatamente os sinais de dor. Usamos também corticoides, que são anti-inflamatórios e promovem um alívio mais prolongado, dando condições para o paciente seguir num processo de reabilitação, que é parte importante no tratamento. Na neuromodulação realizamos implantes de dispositivos que geram estímulos elétricos próximo ao nervo, medula ou no cérebro, inibindo ou bloqueando a sensação da dor. Podemos dizer que na medicina intervencionista da dor, conseguimos realizar uma reprogramação do sistema nervoso, com o objetivo de resolver o sofrimento do paciente.
Qual é o papel da fisioterapia, psicologia e outros tratamentos complementares no controle da dor?
Em muitos casos, são diversos fatores que contribuem para o quadro de dor. Por isso, o tratamento de um paciente com dor, principalmente dor crônica, deve ser sempre multimodal, ou seja, várias modalidades de tratamento devem ser empregadas: médicos de diferentes especialidades, fisioterapeutas, psicólogos, terapeutas ocupacionais estão entre os profissionais que têm grande importância nesse processo terapêutico.
Como o tratamento da dor pode impactar a qualidade de vida do paciente?
Uma pessoa com dor está sofrendo, está debilitada, às vezes não tem capacidade nem para se movimentar sozinha. Sendo assim, a dor pode trazer isolamento social, distúrbios do sono e instabilidade emocional. Então, ao resolver a dor de um paciente, estamos contribuindo para que ele volte às suas atividades e relações sociais.
Existem medidas preventivas que podem reduzir o risco de desenvolver dor crônica ou problemas neurológicos relacionados à dor?
De um modo geral, uma das primeiras medidas a se tomar num quadro de dor é procurar uma avaliação médica logo de início. Quando a dor aguda, causada por uma doença qualquer, é tratada no tempo adequado, a chance dela se tornar crônica é bastante reduzida. Porém buscar entender melhor a dor, suas causas e gatilhos, adotar estilo de vida saudável com alimentação regrada, atividade física regular, ter sono de qualidade, cuidar do estresse e outras alterações emocionais, evitar o tabagismo e o consumo de bebida alcoólica em excesso, são ações que os pacientes devem ser orientados a realizar, não só para a prevenção, mas também para o tratamento da dor crônica. Concluímos assim que a adesão do paciente a essas medidas está intimamente relacionada ao sucesso da terapia.
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