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Municípios em alerta por instabilidade dos royalties

Instabilidade do mercado tem feito repasses aos municípios oscilarem

Especial J3
Por Leonardo Pedrosa
25 de maio de 2025 - 0h01
Especialistas apontam que Prefeituras receberão repasses com nova queda no próximo mês (Fotos: Agência Petrobras)

A queda nos repasses de royalties e participações especiais em 2025 reacendeu o sinal de alerta entre os municípios produtores de petróleo no Norte Fluminense. Embora ainda distante dos piores momentos da última década – com a cotação do preço chegando a US$30 em 2016 -, o cenário atual aumenta a ansiedade quanto à sustentabilidade financeira das prefeituras, principalmente em meio à instabilidade econômica mundial. No início de abril, o preço do barril atingiu US$ 62,82, menor patamar desde a pandemia.

Na última quinta-feira (22), Campos recebeu R$ 45,8 milhões, um aumento de 12% em relação aos R$ 40,9 milhões de abril. Macaé registrou uma alta de 14,4%, chegando a R$ 80,2 milhões. Quissamã teve repasse de R$ 11,5 milhões, 8% acima do mês anterior, enquanto São João da Barra alcançou R$ 18,1 milhões, com crescimento de 14,5%. Em São Francisco de Itabapoana, o crédito foi de R$ 4,3 milhões, 21,1% superior a abril. Os valores referem-se à produção registrada em março.

Alerta antigo|Especialistas apontam que economia de Região Norte Fluminense ainda é muito dependente das receitas voláteis dos royalties

O resultado é um alívio temporário após a frustração nas receitas registrada nos dois meses anteriores. Em abril, por exemplo, todas as cidades da região haviam sofrido quedas expressivas: Campos (-15,8%), Macaé (-17,8%), Quissamã (-16,8%) e São João da Barra (-12,3%). Já nos repasses de Participação Especial, pagos em maio com base na produção do primeiro trimestre, as perdas também foram relevantes: Campos (-15,7%), Quissamã (-100%) e São João da Barra (-36,8%). Macaé foi o único a registrar crescimento, com alta de 13%. São Francisco de Itabapoana, que só recebe royalties, teve queda de 4,6%, com R$ 3,5 milhões em abril.

Wellington Abreu (Foto: Arquivo J3News)

Para o especialista em petróleo e Superintendente de Petróleo e Gás de SJB, Wellington Abreu, o aumento pontual nos royalties não elimina os riscos. “Apesar deste resultado momentaneamente favorável, o cenário global segue marcado por elevada volatilidade. A cotação do petróleo, que se mantinha acima dos US$ 70 até março, sofreu uma queda expressiva, atingindo o patamar de US$ 60 no mês de abril, permanecendo até o presente momento oscilando entre US$ 60 e US$ 66”, disse. Ele afirma, ainda, que o repasse de junho, baseado no desempenho de abril, deverá refletir os impactos da paralisação da plataforma P-53, na Bacia de Campos.

Marcelo Neves (Foto: Silvana Rust)

O secretário de Petróleo, Energia e Inovação de Campos, Marcelo Neves, também secretário-executivo da Organização dos Municípios Produtores de Petróleo (Ompetro), antecipa um novo recuo para junho. “Se espera uma redução na arrecadação de royalties da ordem de 15,18%, em relação ao mês de maio, fruto da queda na cotação média do Brent [valor] em abril e da redução da produção (-25%) mensal do campo Marlim Leste na Bacia de Campos, onde está localizada a plataforma P-53, que teve sua operação interditada pela Agência Nacional do Petróleo e Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) no dia 17 de abril e que perdura até o presente momento”, disse.

Ranulfo Vidigal (Foto: Arquivo J3News)

De Estados Unidos x China ao Norte Fluminense
O economista Ranulfo Vidigal explica que a principal causa da redução dos repasses é a queda do preço internacional do barril de petróleo, pressionado por fatores econômicos e geopolíticos. “Estamos vivendo uma desaceleração cíclica do preço e ele decorre do fato de a China estar sofrendo essa barreira toda associada à questão tarifária e a sua briga tecnológica com os EUA, que reflete, sobretudo, na redução da demanda chinesa. A China é uma grande importadora de petróleo, mas sua desaceleração do crescimento econômico precisa de menos petróleo, e sobrando petróleo, consequentemente, causa uma queda nos preços”, afirma.

Outro fator, de acordo com Ranulfo, é a estratégia da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) de permitir a flutuação do preço para tornar menos competitivas outras fontes de petróleo mais caras. O resultado é um barril que ainda não se estabilizou.

Mas a tendência é mesmo de queda, afirma Wellington Abreu. Embora o mercado pareça ter absorvido inicialmente a mudança, com uma recuperação para patamares acima de US$ 65, a volatilidade e a incerteza persistem mediante a política dos EUA: “Essa leve recuperação para um patamar acima de US$ 65 ainda não é suficiente para afastar o risco. Se o barril cair abaixo dos US$ 60, cortes e ajustes mais duros nas contas públicas locais serão inevitáveis”, afirma.

Prudência e busca por alternativas
A perda de receita atinge principalmente os investimentos em infraestrutura, já que os municípios, em sua maioria, usam os royalties para custeio de obras, e não para folha de pagamento. Vidigal aponta que a tendência é de redução no ritmo. “Ao longo deste ano e no primeiro semestre do ano que vem, os municípios do Norte Fluminense devem enfrentar uma redução drástica de novos investimentos em infraestrutura e cortes no custeio da máquina pública”, diz.

Diante do cenário, os municípios já adotam medidas para minimizar os efeitos da queda nos repasses. Macaé informou uma série de ações para manter o equilíbrio fiscal, como incentivo à agricultura e turismo, parcerias público-privadas e modernização dos serviços de arrecadação. Também aposta na atração de empresas e apoio ao empreendedorismo local.

Quissamã declarou estar atenta à instabilidade das receitas e reforçou o compromisso com o equilíbrio fiscal, anunciando revisão de despesas e estímulo ao turismo, agricultura e empreendedorismo.

São João da Barra informou que investe em tecnologia para aumentar a arrecadação própria, além de manter a responsabilidade na gestão pública com contas aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ).

Preocupação|Queda na produção deve derrubar repasses mês que vem

São Francisco de Itabapoana, que não recebe Participação Especial, destacou que a queda nos royalties em abril afetou diretamente serviços como saúde e educação. A cidade disse que aposta na cobrança da dívida ativa e incentivos ao agronegócio e ao turismo para manter a estabilidade.

A recomendação dos especialistas é clara: diversificar a economia e reduzir a dependência do petróleo. Vidigal ressalta que as cidades têm potencialidades próprias. “Campos, por exemplo, é um polo logístico, educacional e de saúde privada. Macaé tem alta empregabilidade e apenas 20% da receita vem dos royalties. São João da Barra tem o Porto do Açu, que transformou sua realidade. São Francisco tem especialização agrícola, além do veraneio e turismo”, avalia.

Vidigal encerra com um alerta e uma esperança: “A chave está na tecnologia e na transição energética. Municípios que investirem na capacitação da mão de obra e se prepararem para atrair indústrias com base tecnológica estarão mais bem posicionados para enfrentar esse novo ciclo”, explica.

Campos foi o único município citado que não retornou à solicitação da reportagem.