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Som alto coloca bares da Pelinca na mira da Justiça

Os ouvidos dos promotores estão atentos ao excesso de som que já resultou na interdição de um botequim por ordem judicial

Campos
Por Thiago Gomes
6 de maio de 2018 - 0h01

Estabelecimento foi fechado por ordem judicial (Foto: Silvana Rust)

A polêmica é antiga: de um lado, moradores da Avenida Pelinca reclamam de barulho; do outro, donos de bares no lugar — que concentra a vida noturna mais agitada de Campos — alegam que estão tentando ganhar a vida. No meio dessa briga está a Superintendência de Postura Municipal, que garante fiscalizar com frequência o local, embora reconheça se tratar de “uma área mista” na qual som nos estabelecimentos é permitido, desde que não haja excesso. No último fim de semana de abril, um restaurante com música ao vivo foi fechado na Pelinca, por ordem judicial, e outros três na mesma área são alvos de investigação do Ministério Público Estadual (MP-RJ) e podem sofrer as mesmas sanções.

O pedido de interdição do Parente Botequim, no último dia 28, partiu do promotor de Justiça da 1ª Promotoria de Investigação Penal de Campos, Fabiano Rangel Moreira. Tal solicitação, deferida pelo juiz da 2ª Vara Criminal de Campos, Leonardo Cajueiro, veio de uma reclamação coletiva, apresentada em outubro de 2017 ao promotor por meio de um abaixo-assinado. Ainda segundo Fabiano Rangel, a denúncia dos moradores da Pelinca não estava restrita ao Parente, mas incluía outros três pontos que seguem sob investigação. O promotor, no entanto, não revelou o nome dos outros alvos de averiguação.

No caso do Parente Botequim, além do som alto comprovado pelos técnicos do Ministério Público em três ocasiões, outros dois fatos chamaram a atenção do promotor: ausência de alvará de funcionamento expedido pela Secretaria Municipal de Fazenda e ausência de autorização de funcionamento do Corpo de Bombeiros.

Em relação ao som alto, que é o motivo da queixa dos moradores, Fabiano Rangel explica que há jurisprudência que estabelece como aceitável algo em torno de 55 decibéis até as 22h. Contudo, na última verificação do MP-RJ, ocorrida em 18 de novembro de 2017, o medidor marcou 79.7 decibéis antes das 22h e 84.7 após este horário na área externa do Parente Botequim.

Os proprietários do Parente Botequim não quiseram falar sobre o assunto. Eles divulgaram na rede social do estabelecimento a seguinte nota: “O Parente Botequim vem a público esclarecer que procura sempre colaborar com as autoridades públicas de todas as formas possíveis. Neste sentido, medidas já estão sendo tomadas a fim de que as exigências dos órgãos públicos sejam devidamente satisfeitas. Em breve as Tardezinhas do Promessa estarão de volta ao Parente”.

Ação do Ministério Público

O promotor lembrou que há outros casos de excesso na mesma área, mas que o Ministério Público só pode agir quando acionado, como aconteceu com o abaixo-assinado que resultou na interdição do Parente. “A forma mais efetiva de mudar essa barulhenta realidade seria através de lei municipal, de responsabilidade dos vereadores e do próprio prefeito, que teriam condições de reforçar as regras do silêncio noturno e de fazer respeitar o sossego alheio”, pontuou Fabiano Rangel.

Ainda segundo o promotor, a responsabilidade de quem produz barulho em excesso pode ser enquadrada em três situações: como contravenção penal, pelo artigo 42 (perturbação do trabalho e do sossego alheios); pelo artigo 65 (perturbação da tranquilidade), ambos do decreto-lei nº 3.688/41; ou como crime ambiental, disposto no artigo 54 da lei nº 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais).

“Por ultrapassar 55 decibéis, temos as contravenções penais. Por ultrapassar 70 decibéis, temos o crime de poluição sonora”, esclareceu.

Reclamações

O advogado Ricardo Sanfim, que é síndico de um prédio da Pelinca, ressalta que os moradores da área não ambicionam o fechamento de todos os bares e boates e o fim da vida noturna no local. Para ele, é possível que as partes convivam em harmonia, desde que a legislação vigente que regulamenta o ruído seja respeitada. “E isso não tem acontecido. O som extrapola, e muito, o limite do aceitável”, garantiu.

A fiscalização, que é de responsabilidade da Superintendência de Postura Municipal, não tem sido efetiva, de acordo com o síndico. “Se há, de fato, fiscalização, ela não tem surtido qualquer efeito. Nós já desistimos de contatar a Postura. Por incrível que parece, a medida mais eficaz tem sido fazer contato com os próprios estabelecimentos comerciais. Como ele evitam um possível enfrentamento, costumam baixar o som a pedido dos moradores. Mas não dá para fazer isso todas as noites, já que se trata de uma tarefa do órgão responsável pela fiscalização”, criticou Ricardo Sanfim.

Os problemas não se restringem apenas a som alto dos bares e boates. Sons de carros estacionados, muitos deles em locais de parada proibida, brigas e até frequentadores do local que urinam nas portas das casas e prédios foram denunciados pelos moradores à equipe de reportagem do Jornal Terceira Via.

Os empresários que a equipe de reportagem contatou não quiseram falar sobre as críticas dos moradores.

Morador investe em isolamento acústico
Insatisfeito com a poluição sonora da Avenida Pelinca, o médico Gustavo Messinger foi buscar os serviços de uma empresa de São Paulo para fazer o isolamento acústico de dois quartos de seu apartamento.

Na época em que o isolamento foi realizado, há cerca de seis anos, o investimento em esquadrias e vidros especiais para duas janelas foi de aproximadamente R$ 5 mil. O retorno veio em forma de noites de sono para ele e a família. “Foi um dinheiro bem empregado, pois tranquilidade não tem preço. Depois do serviço, em uma certa ocasião houve disparos de arma de fogo na vizinhança e nós nem percebemos”, recordou o médico.

Postura garante que há fiscalização
O critério de avaliação da Superintendência de Postura leva em consideração a localização das casas noturnas e os horários. O responsável pelo órgão, Victor Montalvão, explica que a região da Avenida Pelinca é considerada área mista, onde, no período noturno, o limite máximo permitido é 65 decibéis (para o MP, o limite tolerável na área é de 55 decibéis). Apesar das reclamações dos moradores, Montalvão garante que a fiscalização é feita todos os finais de semana em áreas de grande concentração de estabelecimentos comerciais com música.

“Vários inquéritos civis públicos em relação a casas noturnas foram instaurados e a superintendência, em alguns casos, tem o papel de informar ao Ministério Público os decibéis flagrados durante a fiscalização. Pessoas que se sentirem prejudicadas por volumes acima do permitido podem entrar em contato com a superintendência de Postura, em horário comercial, pelo telefone (22) 98168-3645 ou, até mesmo, para a Polícia Militar, através do 190”, informou Montalvão.