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Um feriadão histórico

Período de descanso tem muito significado, história e cultura

Clube J3news
Por Nelson Nuffer (Estagiário)
20 de abril de 2025 - 0h02

Mais de um mês após o feriado de carnaval, o ano de 2025 passa por mais um feriadão, tão grande quanto o primeiro, mas não tão comum. Neste ano, a folga se prolonga entre os dias 18 e 23 de abril, somando cinco dias consecutivos para o lazer e descanso, graças à combinação da Sexta-feira da Paixão (18), Tiradentes (21) e Dia de São Jorge (23). Uma sequência extensa unindo feriados nesta época não acontecia desde 2020, quando o Estado do RJ teve um período de 9 dias seguidos de “feriadão”, se contados os finais de semana.

Há de se destacar, também, que logo no começo do feriado, é comemorado o Dia dos Povos Indígenas. Para saber o significado dessas datas celebrativas, o J3News conversou com a historiadora e diretora do Museu Histórico de Campos, Graziela Escocard, para explorar a riqueza dos contextos de cada uma delas.

“Neste período, o calendário brasileiro reúne datas que expressam a complexidade da nossa formação: fé, luta e ancestralidade se entrelaçam. A Semana Santa, Tiradentes e São Jorge não são apenas feriados, são janelas para entender a pluralidade cultural que nos forma”, comenta a historiadora.

Semana Santa e Páscoa
A Sexta-feira Santa (18), ou Sexta-feira da Paixão, faz parte do período religioso mais relevante para o cristianismo. A data, que relembra a crucificação de Jesus, é feriado nacional desde 1966, consolidado pela Lei nº 9.093/1995.

Segundo a tradição cristã, na Sexta-feira Santa Jesus foi condenado à crucificação e morreu pelos pecados da humanidade. Todo o ministério de Jesus na terra culminou no dia de sua morte. Nesse dia, ele cumpriu seu objetivo: pagar pelos pecados dos homens.

Já o Domingo de Páscoa (20), embora não seja feriado por cair no domingo, mantém seu peso simbólico. A data é móvel, definida pelo primeiro domingo após a lua cheia do equinócio de outono.

“Algumas leituras mais críticas veem a Páscoa como parte de uma herança colonial cristã, imposta a outras culturas, inclusive às religiões indígenas e africanas, que tiveram seus calendários e rituais deslegitimados”, diz.

Dia dos Povos Indígenas: O legado dos goitacá em Campos dos Goytacazes
A folga prossegue no dia 19 de abril, data que homenageia os povos originários do Brasil. Inicialmente chamado de “Dia do Índio” em 1943, o termo foi atualizado para “Dia dos Povos Indígenas” em 2022, após um decreto federal, buscando reconhecer e respeitar a diversidade dos povos originários.

“Mais do que uma celebração cultural, o 19 de abril é um momento de reconhecimento histórico, e de lutar contra o apagamento, o preconceito e a marginalização que os povos indígenas enfrentam até hoje. É um chamado à memória, à justiça e à valorização da ancestralidade brasileira”, afirma Graziela.

De acordo com a historiadora, o grupo indígena que habitava a região antes da colonização portuguesa era conhecido por sua resistência feroz. “Os goitacá eram considerados um dos grupos mais difíceis de serem dominados pelos portugueses no litoral brasileiro. Esses indígenas viviam da pesca, da caça e da coleta, e tinham um conhecimento profundo dos rios, da mata e dos ciclos da natureza. Saberes que influenciaram muito a formação cultural da região”. Ela reforça: “Hoje, mesmo com a ausência física desses povos, a presença indígena resiste na cultura, na toponímia e nas tradições locais, e deve ser lembrada e valorizada, especialmente por quem é da terra”.

Tiradentes
Na segunda-feira, dia 21, o feriado nacional civil de Tiradentes homenageia Joaquim José da Silva Xavier (1746-1792), mártir da Inconfidência Mineira, um movimento do século XVIII que buscava a independência do Brasil em relação a Portugal.

Imagem: Acervo do Museu Paulista da USP

Ele, além de participar de uma das conspirações mais conhecidas da história brasileira, foi um militar e um dentista amador. Foi enforcado em 21 de abril 1792 pela Coroa Portuguesa e, mais tarde, com a Proclamação da República (1889), passou a ser reconhecido como herói nacional. Em 1965, a data da sua morte foi instituída como feriado nacional (Lei nº 662/1949, atualizada pela Lei nº 10.607/2002).

Para discussões sobre a data de Tiradentes, Graziela ressalta que há muito mais a se entender. “Alguns historiadores questionam o fato de Tiradentes ter sido o único da Inconfidência a ser executado, e também o único que não tinha título ou posses, o que levanta discussões sobre classe social e justiça no Brasil colonial”, afirma.

Dia de São Jorge
O encerramento do feriado prolongado, em 23 de abril, é muito celebrado no Estado do Rio de Janeiro: o dia de São Jorge. Feriado estadual desde 2008 pela Lei Estadual nº 5.198, a data une católicos, que veneram o santo guerreiro, e adeptos de religiões de matriz africana, que o associam a Ogum, orixá dono dos caminhos e das tecnologias. 

“É um dia de missas, festas e grandes celebrações nas ruas — principalmente no subúrbio do Rio e em cidades como Campos dos Goytacazes, onde a devoção já foi mais forte”, afirma Graziela. Em Campos, a Diocese celebrará a data na Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte.

São Jorge foi um soldado romano que se tornou um mártir católico ao se recusar a perseguir cristãos. Por esse motivo, foi morto em 303 d.C., uma ordem direta de Diocleciano, então imperador romano. Por esta razão, conta a história que Jorge foi decapitado no dia 23 de abril.

“O reconhecimento de São Jorge como feriado no Rio de Janeiro também é uma forma de afirmar a identidade cultural e religiosa popular do Estado. No entanto, há debates sobre a legitimidade de feriados religiosos em um estado laico”.