O interior do Rio de Janeiro, região conhecida pela cana-de-açúcar e tradição agropecuária, começa a ganhar uma nova identidade no campo. Em Campos dos Goytacazes, a produção de soja vem ganhando força e visibilidade. O avanço dessa cultura tem chamado atenção para uma realidade que poucos imaginavam possível: soja no Norte Fluminense. Com resultados consistentes, o município já desponta como o maior produtor de soja do interior do Estado.
A produção ainda não compete com os gigantes do Norte e Centro-Oeste, mas chama atenção pela eficiência, o que tem atraído olhares, surpreendendo até os mais experientes do setor.
“A quantidade que Campos produz ainda é pequena se comparada aos estados de Mato Grosso, Goiás e Pará, mas o que está sendo feito aqui tem muita qualidade. Os produtores que apostaram nessa cultura começaram com seriedade, usando tecnologia de ponta e cuidando bem dos custos. Mostra que estamos no caminho certo e temos tudo para crescer ainda mais”, explica o presidente do Sindicato Rural de Campos, Ronaldo Bartholomeu.
Dados da Secretaria Municipal de Agricultura, Pecuária e Pesca mostram que Campos conta com três fazendas voltadas ao cultivo de soja, todas na localidade de Santa Cruz. Ao todo, são 850 hectares plantados — o equivalente a mil campos de futebol — que resultaram em cerca de 3 mil toneladas na última safra.
A produtividade ficou em 55 sacas por hectare, um desempenho considerado expressivo para um município que, até pouco tempo, sequer aparecia no mapa da soja brasileira.
Para alcançar esses resultados, segundo o secretário Almy Júnior, a tecnologia no campo tem sido decisiva: produtores estão investindo em sementes adaptadas e técnicas que ajudam a preservar o solo e garantir bons rendimentos.
“O que faz de Campos um território promissor para a soja é o avanço da ciência brasileira. A Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] e outras instituições desenvolveram variedades adaptadas para diferentes regiões, inclusive às nossas, que têm solos planos e um clima que, mesmo desafiador, permite bons resultados”, afirma.
Segundo a Prefeitura, a secretaria tem atuado em várias frentes para incentivar o cultivo da soja no município. Nos últimos anos, o órgão passou a apoiar o “Dia de Campo: Pesquisa e Desenvolvimento da Soja no Norte Fluminense” e vem oferecendo suporte técnico aos produtores interessados em diversificar suas lavouras, além de disponibilizar maquinário e investir na recuperação de estradas vicinais.
“Um grande produtor precisa de estrada, de escoamento, então nosso papel é garantir infraestrutura. A Estrada de Santa Cruz, por exemplo, estava completamente abandonada e foi reconstruída. Essa é a contribuição do poder público para que a produção rural funcione e cresça”, destaca o secretário de Agricultura, Almy Júnior.
O secretário reforça também a importância da assistência técnica especializada. “Não dá mais para plantar soja sem acompanhamento técnico. A escolha da variedade, o tempo certo de plantio, o manejo do solo — tudo isso influencia diretamente no sucesso da safra. Se o produtor não tiver um bom agrônomo ao lado, a chance de erro é grande. Hoje, plantar soja é ciência aplicada”, completa.
O que dizem os produtores
Outro fator que tem contribuído para o fortalecimento da produção é a logística. Parte da safra já está sendo escoada diretamente pelo Porto do Açu. Em abril, Campos vai exportar cerca de 1,9 tonelada de soja. Todo o volume segue armazenado no Porto até que atinja o número necessário para o carregamento do navio com destino à Rússia. Com o restante da soja, esta será a sexta embarcação do produto exportada aos russos pelo Açu.
A Fazenda Santa Olga é precursora no plantio de soja em Campos e já ultrapassou cinco safras em 100 hectares dedicados à colheita. É a única produção que conta com um pivô de irrigação, máquina considerada top de linha para produção em larga escala
Já na Fazenda Santa Cruz, o produto é cultivado em 475 hectares; a última safra rendeu 1,5 toneladas que estão no terminal do Porto do Açu.
A Fazenda Santa Helena mantém 225 hectares dedicados ao cultivo de soja. Toda a produção da última safra será exportada diretamente pelo Porto, o que, segundo o produtor Geraldo Gonçalves, representou uma vantagem significativa.
“A logística para o Açu é muito boa. A gente levava para o Porto de Santos, mas perdia muito por causa do frete. Então, o Porto hoje é o melhor dos mundos e um dos principais potenciais para soja da nossa região, porque não tem custo de frete. Se vendemos a R$ 127, temos um frete de R$2, ou seja, vendemos 125. Antes o custo seria de R$15. Isso é ótimo. A soja mais perto de um Porto no Brasil é a de Campos, por isso a visão de futuro da soja aqui é muito boa”, disse Geraldo.
Diversificação no campo
O fortalecimento da soja no interior levanta um questionamento: a cultura veio para substituir a cana-de-açúcar em Campos? Para o presidente do Sindicato Rural, Ronaldo Bartholomeu, a resposta é simples.
“É mais uma opção que os produtores têm e pode ser plantada na renovação da lavoura da cana ou de pastagens. É uma cultura de ciclo curto, o que permite uma espécie de renda extra na mesma área. É possível até três colheitas por ano em uma área, então a soja pode ser uma dessas culturas, gerando ganhos para o produtor e mais fertilidade para o solo”, afirmou.
Na avaliação de Almy a diversificação é a melhor estratégia para fortalecer o campo: “A soja vem para diversificar a economia agrícola da nossa região e gerar ainda mais emprego e renda. Campos tem 350 mil hectares de terras cultiváveis e, hoje, apenas 30 mil estão ocupados com cana. A cana é importante, como também são o eucalipto, o café, entre outros. Uma monocultura não dá certo em lugar nenhum”, defendeu.
Com base nos números, avanço nos últimos anos e opinião de especialistas ouvidos pela reportagem, a soja traz novas possibilidades, ajuda a girar a economia e mostra que o campo tem espaço para mais. É diversificando que a cidade olha com perspectiva de crescimento com os pés na terra e o olhar no futuro.