Li, por indicação de uma amiga psicóloga, o livro de Arthur Guerra e Nizan Guanaes, cujo título é “Você aguenta ser feliz?”, onde o médico e o paciente escrevem sobre o caminho para o equilíbrio da saúde mental por meio da saúde física. Preciso dizer que sou fã do Guanaes, não pelos seus êxitos, que são inúmeros, mas pela capacidade que ele tem de ensinar a pedagogia de seus fracassos. Nizan, obeso, chegou a pesar em arrobas, se submeteu a cirurgia bariátrica, tornou-se consumidor voraz de álcool. No meio de sua trajetória, tentando colocar o trem no trilho, encontrou o seu psiquiatra Arthur Guerra, que lhe propôs o tratamento para a vida: esporte para curar o corpo, a alma e a mente.
Nizan foi apresentado ao mundo da corrida de rua e saiu da obesidade para se transformar em maratonista e triatleta. Quando cruzou a linha de chegada da meia maratona de Porto Alegre, em último lugar, o que menos importava era a colocação. O sorriso no rosto e o texto na rede social democratizavam o que o livro indica: a vitória está no processo, na capacidade do ser humano em se desafiar, na glória pela perseverança e dedicação, na árdua tarefa de manter uma rotina de exercícios físicos, de levantar e calçar um tênis para correr, quando o mundo dorme ou de vestir uma sunga para cair na piscina, quando tantos outros se refestelam debaixo de um cobertor.
EliudKipchoge, o maior corredor fundista de todos os tempos, disse certa vez que só os disciplinados são livres, porque os indisciplinados são escravos de suas vontades. Falou mais: disse que a maratona é como a vida, onde sentiremos dor, encontraremos dificuldades no percurso, mas precisaremos levantar a cabeça e seguir. Até cruzar a linha de chegada.
Engana-se quem pensa que o livro é sobre corrida. Muito mais do que isso, é sobre vida. Sobre vida saudável, que permite a sintonia com a felicidade. Numa sociedade do sucesso e da vitória instantânea, ninguém mais quer o trabalho do percurso, mas a vitória pronta. Como miojo. Mas é o percurso que induz à felicidade. Buscar tempo para o simples, dentro do cotidiano. Alimentar-se bem a partir do controle das emoções. Dormir bem. Cultivar bons relacionamentos. Exercitar o autocuidado, porque ninguém fará por você aquilo que lhe cabe.
O livro é escrito para uma classe média e alta. A obra vai longe porque é boa. Deveria chegar nas Ministras do Esporte e da Saúde, porque o esporte tem que ser de graça, na praça, para o povo. Mas antes disso, o livro precisa chegar ao Presidente, porque quem tem fome não tem saúde para buscar a felicidade, tendo que matar um leão por dia, para si e para os seus. De qualquer modo, o caminho, para quem pode, está dado. Buscar atalho desaguará no fracasso.
Tiago Abud – Articulista e Defensor Público
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