Uma das vistas mais bonitas da cidade de Campos dos Goytacazes é a do Rio Paraíba do Sul, na Curva da Lapa. Oficialmente, o bairro se chama Vicente Gonçalves Dias, mas o nome “Lapa” prevalece. A área se destaca pela paisagem, pela igreja e monumentos históricos, por lendas urbanas, por ser reduto de embates políticos. Entretanto, problemas de insegurança, despejo de lixo e entulho, depredação de bens públicos têm se repetido nos últimos anos. A orla sofreu algumas intervenções feitas por gestores municipais, mas o abandono é visível e se mantém.
O Cais da Lapa, potencial área para exploração turística e comercial, tem sido apenas estacionamento de veículos. Nos fins de semana, algumas famílias aparecem para apreciar a vista do Paraíba e tirar fotos. Alguns pescadores amadores ocupam parte da vegetação bem na curva. Marciano José diz que utiliza o espaço para pesca esportiva, reclama do lixo deixado, e, às vezes, pela frequência de usuário de drogas. “A gente fica apreensivo. Na rua nem sempre tem policiamento, imagina aqui na parte do rio”, comenta.
Parte das calçadas da orla está esburacada. Algumas grades de proteção para pedestres que usam o passeio estão quebradas. Há riscos de quedas para dentro da área de vegetação e beira do rio. Outro problema que tem se destacado na região é o despejo permanente de entulho em área onde funcionava um areal. Muito desse material atinge a margem do Paraíba. Não se trata de aterramento, mas o despejo é ilegal e visto como crime ambiental. Um carroceiro que estava no local disse que eram pessoas de fora que estariam trazendo o entulho.
A Subsecretaria de Serviços Públicos informou que realiza periodicamente a limpeza no local. “Infelizmente, a população insiste em jogar lixo e entulho em locais inapropriados. Nesta semana uma equipe verificará a situação. Denúncia sobre o descarte de materiais pode ser feita pelo número 98168-7578”, diz uma nota do governo. Sobre a situação das calçadas e guarda-corpo, a Secretaria de Obras, Infraestrutura e Habitação diz que “tomará as medidas cabíveis”.
O Instituto Estadual do Ambiente (Inea) esclarece que a coleta e a destinação correta dos resíduos sólidos urbanos é de competência das prefeituras. “O órgão ambiental estadual fará uma vistoria na área para buscar ações em conjunto com a administração municipal de Campos. Multas deverão ser aplicadas aos infratores que descartam o material de forma inadequada. A fiscalização compete à Prefeitura e ao Inea, de forma supletiva”, diz a nota do órgão.
O professor e ambientalista Aristides Sofiatti lembra que rios e lagoas são Áreas de Proteção Permanente (APP). Em determinados locais não é necessário ser permanente. Um exemplo é a Lagoa de Cima, Área de Proteção Ambiental (APA), criada por Lei Municipal de 1992. A primeira responsabilidade é municipal, depois estadual e federal. Na ausência do município, cabe ao Inea intervir legalmente.
“São duas ações necessárias para combater o problema. Uma é lenta. Trata-se de educação. A outra é a coleta seletiva de lixo e a limpeza das margens. Quando há demora, o poder público tem que agir. Alguém tem que fazer. Neste caso da Lapa é a Prefeitura”, afirma.
Quiosques fechados e depredados
Os quiosques da Lapa já foram um grande atrativo desde os anos 1990. Com o passar do tempo, ficaram degradados e abandonados pelo poder público responsável pela concessão dos pontos comerciais. Alguns se tornaram local para encontro de usuários de drogas. Depois de anos, a área foi revitalizada em dezembro de 2019, na gestão de Rafael Diniz. Todavia, com a pandemia de Covid-19, as construções ficaram boa parte do tempo fechadas e voltaram a ser depredadas.
Dos seis quiosques comerciais, apenas três estão operando. “Não sei por qual razão não estão funcionando. A pandemia atrapalhou bastante o comércio. À noite o lugar não tem guarda municipal e policiamento. O vandalismo voltou”, diz uma comerciante que preferiu não se identificar.
Três espaços criados para funcionarem como lojas de artesanato em projetos de economia solidária tiveram vidros quebrados e passaram a ser abrigos de moradores em situação de rua. A Companhia de Desenvolvimento do Município de Campos (Codemca) lamentou a depredação do patrimônio público e disse que a situação está sendo avaliada.
Templo histórico
A Igreja Nossa Senhora da Lapa data de 1743. O prédio tem sofrido com ações do tempo e falta de manutenção. Do lado externo, parte do telhado parece afetada. Vegetação começa a cobrir paredes e a cobertura do prédio. A reportagem pediu informações sobre a conservação do edifício que é de responsabilidade da Santa Casa várias vezes, mas não houve resposta.
No edifício anexo à igreja funcionou um seminário. Atualmente, opera como escola profissionalizante, ambos mantidos pela Santa Casa de Misericórdia. Este patrimônio histórico resume parte da história da cidade.
“Foi doado pelo Conde de Irajá à Santa Casa de Misericórdia de Campos. Na gestão do provedor José Gomes da Fonseca Paraíba, foi instalado o Recolhimento das Expostas, crianças do sexo feminino que eram entregues na Roda dos Expostos ou Enjeitados”, explica a historiadora Graziela Escocard.
O local também envolve a lenda do rapaz que ficou preso debaixo do sino da igreja e se transformou em jacaré, o Ururau da Lapa. “Precisamos ter consciência acerca do patrimônio histórico de nossa cidade, para assim criar ações preservacionistas. Creio que uma tática de conscientização seja a educação patrimonial, que busca a apropriação da comunidade pela sua herança, como forma de criar o sentimento de pertencimento”, conclui a historiadora.
Galeria com imagens da Lapa