

Tiago Abud – Articulista e Defensor Público – Em determinado momento da História, legisladores se reuniram e entregaram uma Constituição ao Brasil, preconizando que viveríamos em uma democracia. Trinta e sete anos depois, ela é uma obra inacabada, acessível apenas para poucos.
Segundo o último Mapa Histórico dos Grupos Armados, estudo produzido pelo Instituto Fogo Cruzado e pelo Geni-UFF, com dados da Região Metropolitana do Rio de Janeiro de 2007 a 2024, é possível atestar que quase 4 milhões de moradores do Grande Rio (equivalente a 35% dos moradores da região) vivem em áreas dominadas por grupos armados, o que significa um crescimento de 130% em dezoito anos. Tais grupos crescem nas áreas mais pobres.
Há uma epidemia de feminicídio no Brasil. Mulheres precisam lutar pelo direito de existir, quando seus algozes estão, na maioria das vezes, dentro dos seus próprios lares. Os agressores têm relação afetiva ou biológica com as vítimas, na maioria dos casos.
Deputados condenados fogem para o exterior para não cumprirem penas impostas no Brasil, por crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Fidelidade se transformou em requisito para indicações para a mais alta Corte de Justiça do país, que vive uma sub-representação de mulheres nos espaços de poder.
A prisão domiciliar para condenados em regime fechado, por sentença definitiva, não está na lei, mas foi uma criação jurisprudencial a partir do caso Collor. Até aqui somente para ele. Nada mais antidemocrático.
O dono do banco, acusado de um golpe de muitos milhões, está respondendo ao processo em liberdade, quando o sistema penitenciário brasileiro guarda quase 30% de presos provisórios, isto é, sem julgamento definitivo. Em sua maioria pretos e pardos, mas quase todos pobres.
Aliás, o mundo não é igual para todos. Esse mesmo dono do banco teve o seu advogado pegando carona em avião com Ministro da Corte Suprema, segundo noticiou a imprensa. Depois disso, a ação penal passou a tramitar no STF, sob sigilo. Não é ético, muito menos democrático.
Em tempo de Natal, pedir para viver a experiência de uma democracia completa talvez seja muito. Mais fácil sonhar para Papai Noel refundar o Estado brasileiro.
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