

A situação política do Estado do Rio de Janeiro após a prisão preventiva do presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar, é tema da reportagem especial do J3News, “RJ acumula prisões de líderes políticos e expõe falhas no poder”. Na semana passada, o cientista político e professor José Luis Vianna Cruz, da Universidade Federal Fluminense, analisou os efeitos políticos e eleitorais decorrentes das investigações da Polícia Federal.
Bacellar foi preso no dia 3, na Operação Unha e Carne. Segundo a PF, ele é suspeito de ter vazado informações sigilosas da Operação Zargun, deflagrada em setembro, quando o então deputado estadual TH Joias foi preso. Na segunda-feira (8), a maioria dos deputados estaduais votou pela revogação da prisão de Rodrigo Bacellar.
Como analisa a prisão do presidente da Alerj e os possíveis desdobramentos disso?
Em primeiro lugar, é lamentável a gente ter mais um exemplo de suspeitas de associação entre autoridades políticas do Executivo e Legislativo com o crime organizado de alta periculosidade no Rio de Janeiro. O estado tem sido palco de assassinatos políticos, como o de Marielle Franco, e tem se destacado por essa intimidade e interpenetração do crime na política e da política no crime. Criminosos que se candidatam e se elegem, e eleitos que se aproximam da criminalidade. Isso está virando uma marca do Rio já há alguns anos — ou há muitos anos. O caso dos governadores afastados, presos, condenados, outros suspeitos, é uma marca disso.
O que pode acontecer politicamente com o Rio de Janeiro nos próximos meses após esses fatos recentes?
Fica uma situação complexa. Se o governador Cláudio Castro se afastar para se candidatar ao Senado, ou for afastado também pelas várias suspeitas que pairam sobre ele, quem assume é o presidente do Tribunal de Justiça, porque o vice-governador foi para o TCE e o presidente da Assembleia estava preso. Tudo isso cria um caos, uma sensação de que o Estado do Rio está completamente desgovernado há muitas décadas. E não é o único estado que tem esse problema. Eu acho que isso é sintomático.
Como observa o crescimento do crime organizado e a violência no Estado do Rio de Janeiro?
Recentemente, a gente tem visto um fenômeno inquietante. O Comando Vermelho, que nasceu no Rio; o PCC, que nasceu em São Paulo e já está internacionalizado; e o Terceiro Comando Puro, que também nasceu no Rio e está se nacionalizando e competindo com o Comando Vermelho. É um fenômeno nacional muito embricado com a política e com o dinheiro: empresas de fachada, lavagem de dinheiro, irregularidades — como é o caso do Banco Master, que envolve até instituições financeiras. É uma rede amplíssima e complexa, que mistura figuras do Judiciário, do Executivo e do Legislativo. É uma contaminação profunda da política pelo crime organizado.


A prisão de Bacellar e as investigações da Polícia Federal podem influenciar as eleições de 2026?
Isso vai mexer com as eleições de 2026 aqui no estado. Operações como as que mataram mais de 100 pessoas na Maré e na Penha, num primeiro momento, elevaram a popularidade do governador e daqueles que defendem esse tipo de ação. Mas acho que, a médio e longo prazo, a tendência é a própria população perceber o clima de insegurança que essas operações geram. O governador disse que faria mais dez operações, e isso desorganiza totalmente o dia a dia da população das favelas — trabalho, escola, lazer, o direito de ir e vir. Famílias que não têm nada a ver com o crime organizado são afetadas, não só por balas perdidas, mas também por uma espécie de execução, com jovens decapitados. É uma barbárie, uma crueldade, uma violência quase sem controle.
Como observa as consequências disso para segurança pública no Rio de Janeiro?
Isso se mistura agora com a chamada “PEC das Facções” e com a PEC da Segurança Pública, que pretende nacionalizar a discussão da segurança — com o que eu concordo —, e investir mais em inteligência do que em operações armadas que geram muita letalidade. A tendência é um embate no Congresso entre uma política de segurança que privilegie inteligência, integração das polícias, informatização, tecnologia, expansão das câmeras; e outra baseada no improviso, na violência, na força bruta. Estamos falando da prisão do presidente da Assembleia Legslativa, mas acabamos falando de segurança, que é a questão central do Estado do Rio: o problema da implicação da política com o crime e como isso será solucionado. E isso passa por esse embate legislativo em curso.


Como isso deve se refletir politicamente?
Na política, fica tudo muito mexido e aberto. Depende de novos fatos que vão surgir: se os hoje acusados e processados serão condenados e afastados, se novos nomes vão aparecer e alterar ainda mais o cenário. Paralelamente, há a questão da popularidade das candidaturas, que pode ser impactada. Podem surgir nomes não envolvidos com esses escândalos e que se fortaleçam, e pode haver desgaste daqueles que hoje parecem fortes, mas têm suspeitas ou comprovação de integração com o crime. É uma situação muito difícil de prever o desfecho, mas muito lamentável, porque no Estado do Rio isso se tornou endêmico. São décadas e décadas de fatos desse tipo.
Além da capital, como essa insegurança política pode impactar os outros municípios fluminenses?
Acho que as consequências políticas vão atingir quase todos os municípios, porque o interior do Estado do Rio é muito clientelista e dependente da capital. E políticos do interior influenciam a política na capital, como o próprio Rodrigo Bacellar, que é da nossa região. Isso vai repercutir em todos os municípios, porque as alianças atravessam todo o interior.
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