A médica patologista Mariana Petaccia integra o Laboratório de Patologia Molecular da Rede D’Or, em São Paulo. Ela fez parte da lista de palestrantes que participaram do II Simpósio de Genética do Norte e Noroeste Fluminense, realizado nos dias 27 e 28 de junho, em Campos dos Goytacazes (leia aqui). Nesta entrevista, a cientista e pesquisadora aborda sobre “Patologia Molecular e sua Aplicação na Personalização de Tratamentos em Oncologia”, tema central de sua explanação no evento científico, além de outros temas.
A senhora palestrou sobre “Patologia Molecular e sua Aplicação na Personalização de Tratamentos em Oncologia”. Pode comentar a respeito desse tema e como tem sido aplicado?
O tema “Patologia Molecular e sua aplicação na personalização de tratamentos em Oncologia” tem trazido grande avanço para o tratamento do paciente oncológico, além de oferecer novas informações sobre diagnóstico e prognóstico. É uma área que busca, por meio da pesquisa de alterações moleculares e genéticas, auxiliar nessas questões fundamentais: tratamento, diagnóstico e prognóstico.
Esse processo se dá da seguinte forma: a partir da amostra do tumor do paciente, é possível realizar um sequenciamento genético e estudar as alterações dos genes tumorais. Hoje, já existem diversas possibilidades terapêuticas direcionadas especificamente para essas alterações moleculares, identificadas por meio de testes como esses.
Durante o curso, abordamos como é feita essa pesquisa de alterações genéticas nos tumores. É importante lembrar que uma parte essencial desse processo envolve o uso da amostra tumoral do paciente, proveniente de uma biópsia ou de uma cirurgia. Essa amostra passa por um processamento histopatológico em laboratório, onde é confeccionado o bloco de parafina. A partir desse bloco, que contém a amostra do tumor, conseguimos extrair o DNA e o RNA para a realização dos testes genéticos.
Sempre reforçamos a importância da qualidade dessas amostras para o sucesso dos testes moleculares. Isso depende tanto do laboratório de anatomia patológica — que deve seguir normas e procedimentos rigorosos — quanto do hospital ou local onde a biópsia foi realizada, garantindo uma fixação adequada com a substância correta, chamada formalina tamponada, e o manuseio correto da amostra.
As perspectivas são vastas, já que, a partir da identificação de alterações genéticas, abrem-se muitas possibilidades de tratamento para os pacientes.
Pode citar alguns exemplos?
Diversas neoplasias já exigem, como prática clínica rotineira, a pesquisa de biomarcadores para o direcionamento do tratamento. Um exemplo são os adenocarcinomas de pulmão, nos quais é necessário saber o status mutacional do gene EGFR, já que existem tratamentos específicos para alterações nesse gene.
No caso dos tumores de cólon, já no início do tratamento é essencial conhecer o status mutacional do gene KRAS, o que orienta a escolha terapêutica. Os melanomas também exigem a avaliação do gene BRAF para tomada de decisão clínica. Todos esses exames trazem opções terapêuticas adicionais para os pacientes oncológicos.
E qual a perspectiva para o futuro, com base no que já se sabe sobre genética atualmente?
Como comentei no início, os testes de sequenciamento genético — que identificam mutações em genes — continuam sendo muito relevantes. Eles são realizados, principalmente, a partir de amostras tumorais obtidas de biópsias ou peças cirúrgicas, processadas em blocos de parafina.
No entanto, novas metodologias e perspectivas estão surgindo. Um exemplo já incorporado à prática clínica são os estudos de metilação de tumores, muito utilizados atualmente para tumores cerebrais. Nesses casos, o perfil de metilação de um grupo de genes auxilia na distinção de subtipos tumorais, aperfeiçoando o diagnóstico.
Outra tecnologia que tem crescido muito é a chamada biópsia líquida, que pode ser aplicada em diferentes momentos da jornada terapêutica do paciente oncológico. Ela é útil, por exemplo, no cenário metastático, em casos nos quais não se dispõe de amostra tumoral tecidual para testes moleculares. A partir da coleta de sangue periférico, é possível detectar fragmentos de DNA tumoral circulante no plasma do paciente e caracterizar o tumor molecularmente.
A biópsia líquida também está ganhando espaço no contexto de doença residual mínima, quando, após uma cirurgia com finalidade curativa, realiza-se um teste para verificar se ainda há fragmentos de DNA tumoral no organismo, o que pode direcionar decisões sobre tratamentos adicionais mesmo após a cirurgia.
Além disso, busca-se atualmente identificar assinaturas genéticas, como a instabilidade de microssatélites e a deficiência no sistema de recombinação homóloga, que também direcionam terapias específicas — como imunoterapia e o uso de inibidores de PARP, respectivamente. São avanços significativos no cenário da genética molecular.
Após encontros científicos como o II Simpósio de Genética do Norte e Noroeste Fluminense, quais são suas expectativas quanto ao compartilhamento e divulgação do conhecimento científico no estado e no país?
Acredito que eventos como este têm um papel fundamental na divulgação do conhecimento científico, especialmente sobre a aplicação dos testes genéticos. No meu caso, falarei mais especificamente da área oncológica, mas o simpósio contempla outras especialidades também.
Ao promover esse tipo de divulgação, contribui-se para a ampliação do acesso dos pacientes e da comunidade médica a essas práticas, promovendo maior integração entre a pesquisa e a realidade clínica. A difusão dessas informações permite que cada vez mais profissionais estejam capacitados a utilizar a genética molecular de forma efetiva em seus atendimentos.
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