O trabalho está passando por mais uma revolução, agora movida por códigos e aprendizado de máquina. A inteligência artificial (IA), capaz de simular o raciocínio humano, impacta profissões, cria novas carreiras e levanta dúvidas éticas e jurídicas.
A IA permite que máquinas realizem tarefas que, tradicionalmente, exigem o uso da inteligência humana. A IA pode aprender, resolver problemas e reconhecer padrões. Exemplos são os assistentes virtuais como a Alexa, ferramentas como o ChatGPT e DeepSeek, que vão de simples resumos de texto a diagnósticos médicos.
A Inteligência Artificial está presente em diversas áreas do cotidiano atual: nos corretores ortográficos, nos apps de entrega, nas linhas de montagem de carros e até em sites que imitam o trabalho de designers. Essa tecnologia molda setores, trazendo uma revolução silenciosa, mas impactante.
Assim, a IA causa mudanças no mercado de trabalho. Algumas pesquisas, como as realizadas pela consultoria Accenture, sugerem que a IA pode criar mais empregos do que destruir. A empresa estima que a IA poderá aumentar a produtividade em até 40% e contribuir com um crescimento de US$ 14 trilhões no PIB mundial até 2035.
Esse potencial de crescimento traz uma transformação radical em diversos setores. Porém, profissões como motoristas de transporte, com os carros autônomos, e atendentes de telemarketing, que estão sendo substituídos por assistentes virtuais, sentem efeitos contrários desta mudança. No setor financeiro, funções de analistas e operadores estão sendo automatizadas com o uso de tecnologia.
O futuro do trabalho em tempos de IA
Com o 1º de Maio, Dia do Trabalhador, se aproximando, a pergunta que paira no ar é: como ficará o mercado de trabalho com o crescimento das IAs? É um fato que, enquanto algumas profissões podem sofrer uma transformação, muitas outras estão sendo criadas para atender à demanda por novas habilidades.
Como ressalta o engenheiro Henrique da Hora, presidente da TEC Incubadora, “a Inteligência Artificial, bem como qualquer outra ferramenta que surgiu na história da humanidade, sempre vem para transformar o trabalhador”, diz o engenheiro, que completa:“Sou relutante ao achar que tecnologias vão substituir o trabalhador, porque ao longo da nossa história esse debate sempre foi [presente]. Conseguimos nos tornar mais fortes e mais produtivos com os maquinários da primeira, segunda, terceira e agora, quiçá, a quarta Revolução Industrial. A IA pode fazer um tipo de trabalho, mas a criatividade humana é insubstituível”.
A IA está transformando a forma como se ensina e se cria nas áreas do design e do jornalismo, por exemplo. Joelma Alves, professora de design e coordenadora do curso no Instituto Federal Fluminense (IFF-Centro), reconhece o potencial da tecnologia, mas alerta para os riscos da superficialidade e da perda de identidade visual nos projetos.
“A inteligência artificial tem, sem dúvida, impactado profundamente a maneira como projetamos, criamos e ensinamos. É inegável o potencial da IA na democratização das ferramentas de design. Hoje, estudantes e profissionais têm acesso a recursos que antes exigiam horas de trabalho técnico, como: geração de imagens, testes de usabilidade e prototipagem rápida. Tudo isso agora pode ser feito em poucos cliques. Por outro lado, essa facilidade também traz desafios. O risco da repetição, da superficialidade e da perda de identidade nos projetos é real. Acredito que este é um momento propício para repensarmos o design de forma mais ampla, levando em conta questões éticas, de inclusão e impacto social”, afirma. Ela acredita que é crucial formar designers capazes de usar a tecnologia de maneira ética e com um propósito maior.
Já Marcos Curvello, jornalista e professor do curso na UNIFLU, em Campos, vê a IA como uma ferramenta útil, mas não substitutiva do trabalho jornalístico. Ele ressalta que a IA pode auxiliar em atividades específicas, como análise de grandes volumes de dados e transcrição de gravações, mas não pode substituir a apuração e a redação jornalística. “A IA, como é hoje, não pode prescindir nem substituir o jornalismo. Ela é treinada a partir de conteúdo jornalístico, mas permanece incapaz de apurar, entrevistar e dar tratamento final ao texto jornalístico conforme a linha editorial de um veículo e as boas práticas da profissão. No jornalismo, penso que a IA deve ser empregada como uma espécie de assistente. Seu conteúdo sempre deve ser revisado por profissionais para garantir que a informação dada é correta e está de acordo com a apuração feita”, opinou.
Ambos os professores concordam que a adaptação aos novos sistemas é inevitável, mas deve ser feita com bom senso. Joelma enfatiza que a adaptação à IA no design deve ser crítica e contextualizada, enquanto Curvello acredita que, no jornalismo, a regulação e o uso consciente da IA são fundamentais para preservar a qualidade do trabalho e a ética da profissão.
As respostas dos dois educadores mostram um panorama comum: a IA tem grande potencial, mas seu uso precisa ser equilibrado, como ferramenta, e não como forma de substituir a criatividade humana.
Quem responde pela inteligência artificial?
À medida que a IA avança, surge a necessidade de um debate sobre os riscos legais e as implicações dessa tecnologia nas diversas profissões. A advogada e especialista em direito digital Luiza Coutinho, autora do livro “Riscos em sistemas de Inteligência Artificial: definição, tipologia, correlações, principiologia, responsabilidade civil e regulação” destaca que a IA traz desafios no campo jurídico.
“As principais matrizes de riscos apresentados por sistemas de Inteligência Artificial envolvem os danos, reais e potenciais, aos direitos humanos. A responsabilidade pelo uso indevido da IA é um tema ainda em aberto, com especialistas debatendo se o responsável será o desenvolvedor, o usuário ou o fabricante. Além disso, questões como autoria de obras criadas por IA e a violação de direitos autorais também geram discussões. A regulação deve ser baseada nos riscos dos diferentes tipos de IA, com foco na proteção dos grupos mais vulneráveis”, afirma.
Nesse contexto, a advogada acredita que a ascensão da IA não é uma questão de retroceder, mas de se adaptar a um novo cenário: “Um relatório do Fórum Econômico Mundial, divulgado no mês de janeiro de 2025, trouxe uma estimativa de que 41% das organizações globais reduzirão suas forças de trabalho até 2030. Apesar disso, não acredito que seja adequado falarmos em proteção contra a IA, mas sim em compreensão de que os pedidos de moratória de desenvolvimento dessas tecnologias são falaciosos e de que não existe como retrocedermos tecnologicamente”, explicou.
Diante de tantas transformações, profissionais alertam para a necessidade de ampliar o debate sobre o tema. Especialistas concordam que o desafio está em encontrar o equilíbrio: permitir que a inteligência artificial seja uma aliada. Afinal, a reformulação do trabalho não é apenas sobre tecnologia, mas sobretudo de escolhas humanas.
“A IA nos força a pensar sobre o que é essencialmente humano no trabalho. Não se trata apenas de substituir tarefas, mas de reavaliar o valor do pensamento crítico, da empatia e da criatividade”, disse Curvello.