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Sindicato culpa Incra por tensão

Líder dos ruralistas também falou sobre agronegócio e diz que o café é a cultura da vez

Entrevista
Por Aloysio Balbi
22 de abril de 2024 - 7h00
Foto: Arquivo J3News

De uma família tradicional de produtores rurais, Ronaldo Bartholomeu Júnior, presidente do Sindicato Rural de Campos mostra lucidez ao abordar o tema reforma agrária. Diz não ser contrário a ela, e, sim, a forma como vem sendo feita e coloca o que chama de deformação na conta do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Nesta entrevista ele admite que o “Abril Vermelho”, manifestação anual do Movimento dos Sem Terra (MST) causa tensão no campo, mas, garante que até a semana passada nenhuma propriedade tinha sido invadida em Campos, admitindo que houve uma tentativa que foi abortada pela Polícia Militar.

Ronaldo Bartholomeu Júnior cobrou um posicionamento do governo do estado e quer um recadastramento de todos os assentamentos em curso. Também abordou temas relacionados à atividade do agronegócio em Campos e disse que o café está voltando a ser introduzido em terras do município.  

Como o senhor avalia essas manifestações de calendário do Movimento dos Sem Terra? É um mês de tensão no campo?
É, sim, um mês de tensão no campo. O setor agrário vive neste período uma instabilidade jurídica. Em nossa opinião, falando de forma macro, isso não é bom, porque o atual governo federal usa essas pessoas como base de manobra em sua pauta, o que resulta em ocupações e, assim, estabelece um ambiente que pode resultar uma tensão no único setor da economia que apresenta resultados positivos na produção e tem garantido, assim, a alta do Produto Interno Bruto – PIB – que esse mesmo governo se orgulha em exibir. Essa tensão nos remete a um quadro de imprevisibilidade. Da nossa parte não, mas todos sabem a estratégia que esses movimentos usam neste período para chamar a atenção da sociedade para suas causas.

O senhor falou no quadro macro, ou seja, no país. Mas como está a situação no município de Campos e na região?
Até agora não houve invasão de nenhuma propriedade. O que ocorreu foi uma tentativa de invasão que foi abortada pela Polícia Militar. Apesar do estado do Rio não ser considerado um grande produtor agropecuário, o Norte Fluminense é a área de maior produção rural. Até o momento não percebemos nenhuma manifestação do governador do estado ou de deputados estaduais a respeito desta tática usada por esses movimentos. Isso tem preocupado os produtores do nosso município já que a classe política não manifesta claramente um apoio à nossa classe diante deste quadro de pressão. O Sindicato Rural de Campos espera que o governador do estado faça algum aceno favorável às nossas preocupações para que o Norte Fluminense não vire um local de constante instabilidade, exatamente por ser o município fluminense com maior visibilidade na produção agropecuária e, por isso, tem sido espaço preferencial para as manifestações destes movimentos.

Qual seria a solução para resolver essa questão da reforma agrária de vez no país?
O Sindicato Rural acredita que uma das soluções seria determinar que o Incra fizesse um recadastramento em todos os assentamentos que já foram feitos em Campos e nos municípios vizinhos, assim como em todo o país. Que, primeiramente, se apure o que é produzido nestes assentamentos e quem são as pessoas que hoje estão nestas áreas. Qual seria o percentual de assentados originais que estão ocupando essas terras? Falo no uso do mesmo critério do Incra: o perfil social de quem produz, o que produz e como produz, me referindo nessa última parte à questão ambiental. Então, o que quero dizer é que o assentado original na maior parte das vezes repassa a terra para terceiros.

É fato que muitas terras desapropriadas pelo Incra foram repassadas para terceiro?
É verdade. Basta que o Incra faça um recadastramento nestes assentamentos que o órgão vai constatar isso. Volto a insistir que é preciso urgentemente saber o que está sendo produzido nestas áreas. Deixar claro que o Sindicato Rural não é contra a reforma agrária. O que queremos é que os assentamentos cumpram o mesmo papel dos produtores, ou seja, com produtividade e com tudo o que nos é cobrado constantemente, como produtividade, conservação do meio ambiente e responsabilidade social. A partir do momento em que um assentado ganha sua terra, ele passa a ter as mesmas obrigações nossas e isso não está acontecendo.

O Sindicato Rural vai fazer um dia de Campo sobre café em uma área de assentamento em Campos? Isso é Verdade?
Sim, é verdade. O Sindicato Rural em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizado Rural (Senar) desenvolve em nosso município cursos técnicos em várias áreas do agronegócio, objetivando capacitar produtores em vários segmentos da atividade agropecuária, e oferecendo assistências técnicas. O Sindicato, o Senar e a prefeitura de Campos irão promover no próximo mês de junho, um Dia de Campo sobre produção de café, dentro do assentamento da antiga usina Novo Horizonte, no distrito de Rio Preto. Na ótica do Sindicato Rural, o assentado que quiser trabalhar, será muito bem-vindo ao nosso sindicato como associado. Temos no Sindicato um setor somente para cuidar desta documentação para que ele seja um produtor pleno, pertencendo ao nosso quadro de associados. Aproveito aqui para convocar os produtores para se associarem e fortalecerem o nosso sindicato, pois uma grande parte precisa fazer a regularização fundiária, para que todos tenham acesso ao crédito rural, entre direitos e benéficos, para não continuarem pedindo esmola aos políticos na espera de recursos que acabam nunca chegando.

O Incra não peca um pouco em não identificar corretamente a vocação dos assentados para a agropecuária?
Peca muito. Tanto é que estamos cobrando esse recadastramento nesses assentamentos em Campos, na região e em todo o país. Uma das coisas que o Incra faz é prometer mundos e fundos para essas pessoas que não tem vocação para a terra, vindas de todas as partes do país. Depois que essas pessoas, sem vocação, assumem a terra, elas, sem condições de produzir, vendem para terceiros e retornam aos seus municípios de origem. Isso não pode continuar acontecendo, pois prejudica o espírito da proposta. Quando essas pessoas sem vocação vendem a terra, acabam caindo no desemprego. Talvez o MST seja muito mais organizado do que o Incra. O Incra tem que ser repensado e refeito.

Como anda a questão do agronegócio de Campos?
O agronegócio, se você pensar em diversificação vai encontrar fazendas produzindo como no Centro-Oeste do Brasil. Elas produzem três culturas anuais, com muita tecnologia e irrigação, com produtividade bastante expressiva, acima da média nacional e estou falando de soja. A pecuária de corte vai caminhando bem, apesar do preço baixo, mas, ainda somos um centro de produção de animais de reposição para vários estados brasileiros. Sabemos que temos carretas chegando a Campos mensalmente para comprar gado. A qualidade e a genética do nosso rebanho são de excelência. Na atividade leiteira, apesar dos preços baixos aos produtores, temos mantido esse segmento, e alguns pecuaristas apresentam produções expressivas. Estamos também criando um selo de qualidade para os produtores de abacaxi do nosso município e produtores vizinhos.

Parece que o café está na pauta. É isso mesmo?
É verdade. O café é uma commodity agrícola de muito valor agregado e, aqui no Norte Fluminense, estamos tendo um retorno das lavouras do café. No Noroeste Fluminense a coisa já está adiantada com um número maior de produtores. Essa parceria do Sindicato com o Senar tem possibilitado o incremento da lavoura do café e se tudo correr bem acreditamos que dentro de no máximo cinco anos já teremos uma produção bem mais expressiva, graças a uma assistência técnica disponibilizada pelo Senar. O mesmo estamos fazendo em respeito ao abacaxi, em Campos e municípios vizinhos.

E cana-de-açúcar?
A cana-de-açúcar é uma pauta permanente. A usina Paraíso foi toda reformada. Só que estamos precisando de matéria- prima, no caso a cana, para que possamos operar com as três unidades – Coagro, a Canabrava e a Paraíso-. Esperamos que o plantio de cana-de-açúcar seja bem maior nos próximos dois anos. Estamos fazendo nossa parte, e gostaríamos que o governo do estado olhasse para o nosso setor com mais atenção. Isso é necessário.

E a questão ambiental?
Precisamos urgentemente sentar com a presidência do Inea para que haja uma reformulação deste órgão, para que ele opere com mais agilidade e deixe de ser o entrave que está sendo, não só na atividade agropecuária, mas, também em outros segmentos da nossa economia.