Dois dias depois de ter sido consumido pelo fogo, o prédio do antigo Hotel Flávio, no Centro de Campos dos Goytacazes, ainda continha fumaça nesta segunda-feira (21) em meio aos escombros. O incidente aconteceu na madrugada de sábado (19) e deixou muita gente apreensiva (clique aqui). Moradores de edifícios próximos tiveram que sair e procurar abrigo em outros lugares, pois o fogo poderia se alastrar. Nesta segunda-feira, outro problema surgiu. O tráfego no cruzamento das Ruas Carlos de Lacerda e Sete de Setembro foi prejudicado, provocando congestionamento. A área precisou ser isolada por riscos de desabamento. A reportagem procurou pela Defesa Civil, Instituto Municipal de Trânsito e Transporte (IMTT) e pelo Corpo de Bombeiros e aguarda um posicionamento sobre a situação do prédio e adjacências. Desde 2018, o Terceira Via acompanha diversos problemas relacionados ao Hotel Flávio, construção do século 19 (leia abaixo).
Bem próximo ao prédio incendiado, funciona uma loja de produtos de decoração, separado por outro edifício residencial que foi desocupado devido aos riscos. Quatro famílias deixaram os apartamentos e foram se abrigar em casas de amigos e parentes. A comerciária Aline Dias diz que está muito apreensiva com a situação:
“Estamos muito preocupados, pois o prédio está em ponto de cair e pode ferir ou matar alguém. Nós, lojistas, estamos temerosos da a parede ceder. Se a gente observar as paredes laterais do prédio, vê que estão situação de demolição. Até o momento, não recebemos orientações dos Bombeiros ou da Defesa Civil” .
De acordo com a comerciária que trabalha há 20 anos no local, nos últimos tempos a situação piorou.
“Com o abandono da área central, pessoas em situação de rua estavam ocupando o antigo hotel e promovendo arrombamentos e furtos na rua. O dono do imóvel não aparece e nem dá satisfação. Hoje (21), chegamos aqui e vimos o estrago. Não pudemos abrir a loja antes devido ao isolamento. Os negócios estão afetados, pois o Centro já está devastado. A situação do comércio é preocupante. Aqui não tem transporte público. Agora estamos isolados pelo fluxo de veículos e de pessoas. Eu estou trabalhando preocupada sobre a falta de providências”, lamenta.
Várias pessoas ficaram chocadas quando viram o estado do prédio após o incêndio, como o morador da Rua Sete de Setembro, Luiz Alberto Carvalho. “Tomei um susto quando vi. Falam em conservar, mas ninguém conserva. É um patrimônio histórico entregue aos cupins. Assim não tem jeito. Segurança zero aqui, pois até para o pedestre passar o risco é grande de morrer. A gente olha os prédios velhos, mas não sabe como estão por dentro. Não imaginei que isso fosse acontecer”, disse.
O aposentado Cláudio Luiz Gonçalves, morador do Turfe Clube, lamentou o ocorrido. “Já tem tempo que o prédio está deteriorando. Acho que devia ser restaurado. Eu sou campista, sempre estou aqui no Centro. É uma pena esta situação. Do jeito que está, acho que vão jogar abaixo para abrir um estacionamento. Todos têm feito isso. Virou mania. Aqui em volta há estacionamentos no lugar de prédios que desabaram. Dizem que dá mais lucro”, comenta.
Memórias apagadas
O geógrafo carioca Marcelo Vianna vive em Campos há 20 anos. Ele critica a falta de política de preservação do patrimônio arquitetônico da cidade:
“Ela não é efetiva, uma vez que essas áreas consolidadas no ponto central de Campos, também não recebem os cuidados dos proprietários de prédios históricos. São alvos de disputas familiares e de herança. Campos tem uma relevância histórica e o Município poderia ter essa tomada. Além da importância política, econômica e cultural no Estado do Rio de Janeiro, era para se pensar políticas de preservação e habitacional”, sugere.
Para o geógrafo, problemas de abandono como o Hotel Flávio devem continuar acontecendo na cidade.
“Os prédios históricos centenários não são preservados pelas famílias proprietárias. Deveria haver uma taxação sobre essas propriedades, para repensar a reestruturação e a política de preservação. Sistematicamente, essas moradias têm se tornado estacionamento na área central, descaracterizando o que é o coração de uma cidade, na relação comercial e cultural de pessoas. Muito da memória e da cultura se vão. Para onde vamos? Como planejar uma cidade? Quando vejo esses prédios históricos tão importantes ruindo, considero isto uma prática criminosa. Trata-se de uma política de apagamento da memória de Campos dos Goytacazes”, conclui.
Nota do Corpo de Bombeiros
O 5º Grupamento de Bombeiro Militar informou que após o incêndio na madrugada do último sábado (19), que atingiu o prédio onde funcionou o antigo Hotel Flávio, o Corpo de Bombeiros-RJ monitora possíveis focos de incêndio que possam surgir devido a grande quantidade de madeira que faz parte da estrutura da edificação:
“As condições do prédio em relação a riscos aos vizinhos ficam sob responsabilidade da Defesa Civil municipal que analisa, verifica e avalia possíveis danos à estrutura. A corporação não tem informações sobre o que pode ter causado o incêndio”, disse em nota.
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