“Começa com um puxão de cabelo, um tapa no braço, depois um tapa no rosto, e falam: ‘desculpa, perdão’, e você cai nessa”, conta Priscila, de 27 anos. “Ele me manipulava demais. Além disso, colocou fogo em roupas minhas das quais ele não gostava e quebrou coisas”.
Questionada se há violência pior que outra, ela diz: “A física bate e dói na hora. A psicológica é pior. A física também gera a psicológica. Eu vi marcas roxas no meu corpo, e isso foi me matando aos poucos. Vivi 11 anos em um relacionamento abusivo”.
A história de Priscila, infelizmente, é como a de muitas mulheres. Segundo o Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a cada 15 minutos uma mulher é agredida no Estado do Rio. Só em 2018, foram registrados 39.646 casos de lesão corporal.
No Brasil, 536 mulheres são agredidas por hora, sendo que 177 sofrem espancamento. Em 76,4% dos casos, a violência foi cometida por conhecidos, como cônjuge (23,9%), ex-cônjuge (15,2%), irmãos (4,9%), amigos (6,3%) e pais (7,2%).
As vítimas devem ser amparadas pela Justiça, como prevê a lei do feminicídio.
Problema recorrente — A psicóloga Camila Marques explica que os casos de agressões emocionais nos relacionamentos abusivos são muito frequentes.
“Na experiência com pacientes ou em conversas informais é possível perceber que muitas pessoas passam ou já passaram por essas situações, mas não se deram conta disso. Na maioria dos casos, passa de forma despercebida”.
Manuela, de 25 anos, outra vítima, diz que as agressões começaram na primeira relação sexual: “No meio da relação eu disse para parar, ele não parou”. Depois disso, o namorado mudou totalmente: começou a ser possessivo, a criticar o modo como a moça se vestia e a proibiu de usar maquiagem. “Eu não queria aceitar, mas aceitava. Dentro de mim, eu não achava aquilo certo. Era muita pressão psicológica.”
Manuela conta também que tentou suicídio, perdeu os amigos e começou a tomar antidepressivos. Ela relata que se alguém a tivesse aconselhado, não teria aceitado os abusos desde o início.
Sobre como os familiares e amigos devem proceder e como ajudar a vítima de um relacionamento abusivo, a psicóloga Camila responde: “É importante não desvalorizar e nem invalidar o sofrimento e os sentimentos do outro. Caso alguém de fora perceba um indício de relação abusiva pode sinalizar, mas sempre com cuidado, para não apontar e culpar quem está em sofrimento”.
Com o objetivo de orientar mulher que podem estar sendo vítimas de relacionamentos abusivos, o Ministério Público de São Paulo criou uma cartilha intitulada “Namoro Legal”. Nela, há dicas sobre como identificar comportamentos agressivos e entender como funciona a dinâmica de um relacionamento saudável. Para fazer o download dessa cartilha, clique AQUI.
Segundo a advogada Ana Patrícia Pinheiro, muitas mulheres têm medo de denunciar casos de violência por motivos diversos. “Algumas dependem financeiramente de seus companheiros, têm medo de perder guarda dos filhos, pensam que não têm direito ao recebimento de pensão, moram na casa que pertence ao agressor… E é aí que entra o Direito de Família, com as ferramentas necessárias para proteger a mulher da violência e do desamparo. O caso é analisado e, dependendo, o Direito prevê a aplicação das medidas protetivas de urgência, como, por exemplo, o afastamento do lar”, explicou.
Ana Patrícia ainda orienta que as vítimas desse tipo de violência podem fazer a denúncia por meio do número 180, que foi criado exclusivamente para esses casos. A mulher também deve procurar a Delegacia mais próxima para registrar a ocorrência. “Somente a partir da denúncia, essas vítimas poderão conseguir a medida protetiva”.
EQUIPE
Pauta: Edmara Andrade;
Reportagem: Allan Miranda, Dailyele Souza, Juliana Porto, Mariana Bello Marques.
Fotos: Lynda Tavares;
Modelo: Júlia Pinheiro;
Produção das fotos: Juliana Porto;
Podcast: Lucas Ferreira.