O setor sucroalcooleiro em Campos está agonizando. Embora – antes do período de safra, em abril – as expectativas para a produção de 2017 não fossem altas, o resultado da moagem de cana nas três usinas em funcionamento no município ainda foi muito abaixo do esperado. Em percentuais, segundo levantamento do Sindicato da Indústria Sucroenergética, o faturamento deste ano será na ordem de 40 a 50% menor do que no ano passado.
A safra de 2017 começou em maio e junho deste ano e terminou no início do mês de outubro. Esperava-se que as três usinas – Coagro, Paraíso e Canabrava — moessem aproximadamente 1200 toneladas de cana-de-açúcar, quantitativo 15% menor do que o da safra anterior, quando foram produzidas 1400 toneladas da matéria-prima. No entanto, a última safra foi marcada pela menor moagem dos últimos anos: apenas 940 toneladas de cana, divididas entre as três indústrias. Considerando que essa quantidade poderia ter sido produzida em apenas uma unidade, o prejuízo foi grande.
Em abril deste ano, o Jornal Terceira Via publicou a reportagem intitulada “Safra dos sobreviventes: moagem deve ser 15% menor este ano”. Embora o título fosse alarmante, os entrevistados declararam que 2017 seria “um ano promissor”, uma vez que a Usina Paraíso, que até 2016 estava produzindo apenas etanol, voltou a apostar no açúcar e esperava-se que essa retomada contribuísse para o aumento da produção. Mas o tiro saiu pela culatra.
Baixo preço do açúcar
Ainda de acordo com Frederico Paes, os preços dos produtos derivados da cana tiveram uma queda inesperada este ano, principalmente o açúcar, carro chefe das usinas de Campos. “Todos os órgãos de consultoria indicavam um ano razoável para o açúcar, mas o mercado internacional deu um descontrole total e o produto caiu abaixo do custo de produção. Então, a usina não pode fazer só álcool, tem que fazer os dois produtos e, consequência disso, é que praticamente nós tivemos que pagar para trabalhar”, afirmou o presidente Frederico Paes.
Aliás, quem dita o preço da cana-de-açúcar é o mercado, que funciona em commodity agrícola — negociado em bolsas mercadorias, com preços definidos em nível global, pelo mercado internacional. Isso significa que outros estados que também investem na produção de cana e têm mais sucesso — como São Paulo, Mato Grosso e Goiás —, têm também o preço na mão. “Se eles têm uma safra boa, podem vender mais barato. E nós, como somos submetidos a esses preços globais e estamos com a produção baixa, temos grandes prejuízos”, explicou o presidente do Sindicato dos Produtores Rural de Campos, Ronaldo Bartolomeu dos Santos Júnior. Ele disse ainda que uma única usina em São Paulo deve ter produzido em 2017 cerca de 3 a 4 milhões de cana. “Nós temos que acompanhar o preço de quem produz mais. É como ter uma Ferrari para andar em uma estrada esburacada. De nada adianta”, disse.
Situação de Emergência
O presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Campos foi enfático ao afirmar que, para os trabalhadores do setor sucroalcooleiro, a situação do município está “um desastre”. Ele disse que, se já não bastasse o baixo preço do açúcar e a grave estiagem na região, o superintendente de Agricultura do município, Nildo Cardoso, não decreta
“Situação de Emergência”. Essa medida poderia contribuir para que as autoridades das esferas superiores conhecessem a atual conjuntura e disponibilizassem verba para ações de recuperação do setor.
Municípios das regiões Norte e Noroeste Fluminense já solicitaram o decreto: São João da Barra, Bom Jesus do Itabapoana, São Fidélis, Italva, Varre-Sai e Santo Antônio de Pádua. São Francisco de Itabapoana também está tomando as providências para tomar essa medida.
Técnicos, Sindicatos, a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), a associação dos produtores, a UFRRJ, a Pesagro, entre outros órgãos e entidades defendem que o município de Campos decrete situação de emergência.
“Não resolve a situação de falta de chuvas, mas anemiza a situação futura do produtor. Por exemplo, acesso a financiamento para recompor as lavouras, montar projetos de irrigação e outros fatores que podem ajudar ao produtor através do governo federal.
Campos não é um oásis, todos os municípios vizinhos decretaram. Estamos no deserto. Esperamos que o prefeito Rafael Diniz respeite a situação técnica”, explicou o presidente da Coagro.
De acordo com Bartolomeu, na safra de 2017 foram gerados aproximadamente três mil empregos, no entanto, com a baixa produção da matéria-prima, esses trabalhadores receberam menos do que esperavam quando foram contratados. “Acontece que, para as usinas funcionarem, é necessário certo quantitativo de funcionários, independente da quantidade de produção. Isso significa que, se houver muita cana a ser moída, esses funcionários recebem mais; se houver pouca, como este ano, recebem menos porque a mão de obra vai pesar na despesa da usina. Agora imagina… Se está ruim para os empresários, imagina para os produtores rurais que trabalham de forma braçal e mal tem condições de levar alimento para casa?”, destacou o presidente do sindicato.
Ele criticou ainda a postura do superintendente de Agricultura. “Nós, produtores, não entendemos a postura do superintendente. Além de não decretar Situação de Emergência, ele também não aceitou a proposta do Governo do Estado de disponibilizar patrulha mecanizada para fazer a manutenção das estradas vicinais do município por R$ 40 mil mensais — uma mixaria, considerando o tamanho de Campos. Por quê? Por causa de política, por falta de compromisso e de interesse. O prefeito disse em campanha que o que tiraria a cidade do atoleiro era a agricultura, mas não está investindo nisso”, afirmou.
Posicionamento da Prefeitura
Sobre o decreto de “Situação de Emergência”, o superintendente de Agricultura e Pecuária, Nildo Cardoso, informou que “não se pode entrar com o pedido de forma abrupta, principalmente pelo fato de que é necessário levantamento detalhado das consequências da estiagem na cidade, levando em consideração sua dimensão territorial e número de habitantes”. Ele afirmou ainda que “é necessária interação com as entidades do setor e com os órgãos competentes da gestão envolvidos para monitoramento da situação e avaliação dos procedimentos que já estão sendo adotados em relação à questão, como as intervenções de máquinas nos canais da Baixada, que tem o objetivo de aliviar os efeitos da estiagem para os produtores rurais”.
“O município já compilou as informações a fim de embasar, de forma técnica e jurídica, a decisão da decretação ou não da situação. Este documento para ser encaminhado ao Estado e Ministério da Integração Nacional para dar ciência das consequências da estiagem no município de Campos e região”, declarou.
Já sobre a recusa da patrulha mecanizada proposta pelo Estado, o superintendente disse que, ao contrário do foi dito pelo presidente do sindicato, “o valor ofertado por órgão do estado pelos equipamentos em questão, ultrapassa R$ 58 mil mensais, conforme consta em contrato, em uma situação em que não foi permitida fiscalização por parte da superintendência, para verificação das condições de trabalho destes equipamentos”.
Segundo o órgão municipal, ainda, “o mesmo equipamento foi oferecido a outros municípios, porém somente a custo do combustível e pagamento dos operadores do maquinário, mas ao município de Campos, foram exigidos, ainda, outros itens que correspondem à alimentação e transporte dos funcionários que trabalhariam operando os equipamentos”.
Especialistas em Meio Ambiente afirmam que o clima na região mudou. Segundo eles, depois de quatro anos com pouca chuva, o clima hoje é semelhante ao semiárido. Depois da grande seca de 2014 — a maior seca do século, com apenas 500 milímetros de chuva — o índice em Campos assemelha ao agreste nordestino. “É impossível fazer agricultura e pecuária com essa precipitação”, disse o presidente do Sindicato da Indústria Sucroenergética.
Segundo relatório efeitos do clima sobre a produtividade da cana-de-açúcar elaborado pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), os dados do balanço hídrico para a cultura, com base nos dados do Posto Climatológico do campus de Campos, verifica-se que as chuvas do ciclo 2016-2017 não foram suficientes para atender a demanda, constatando-se, até o final de maio, déficits de 1193,9mm para o ciclo das lavouras plantadas no início de 2016 (cana-planta) e déficits de 816,9 mm e 806,94 mm para os ciclos das socas colhidas em junho e setembro de 2016, respectivamente.
Para a próxima safra, em 2018, a lavoura de cana de açúcar já perdeu 50% também por causa da falta de chuvas. A produção será suficiente apenas para colocar umas das três usinas em operação. Frederico afirma que a agricultura está à beira do caos.
“Precisa chover muito para manter esses 50% (perda já existente), não há como qualificar o que está acontecendo com o campo. Tem que andar por lá, conversar com o produtor para ter uma ideia do que está acontecendo”, afirma Frederico Paes. Ele acrescenta que 2018 é um ano preocupante.
“As lagoas secaram, sem nenhum tipo de drenagem. Em 2014 aconteceu a pior estiagem dos últimos 100 anos, mas naquela época os lençóis estavam razoáveis por causa dos anos anteriores. Agora não tivemos chuva suficiente em 2015 e 2016, por isso o estrago pode ser maior” destaca.