O desembargador do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) Peterson Simão, votou a favor da cassação dos diplomas do governador Cláudio Castro, seu vice Thiago Pampolha e o presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), Rodrigo Bacellar. Simão é o relator do caso e foi o primeiro a votar, em julgamento que segue acontecendo na noite desta sexta-feira.
“As provas produzidas são suficientes para concluir que alguns dos investigados precisam ser condenados como forma de fazer justiça. No entanto, as provas poderiam ser muito mais fartas se os investigados tivessem obedecido o princípio da boa fé, lembrando que o TCE-RJ teve seríssimas dificuldades parar apurar o que estava acontecendo na Ceperj e na Uerj. O que ocorreu neste letígio foi a sonegação de informações. Sobretudo, no que se refere a folha de pagamento secreta e pagamentos na boca do caixa de mais de 20 mil pessoas. Conclui-se que a gravidade dos ilícitos comprometeu a legitimidade do processo eleitoral de 2022”, manifestou o desembargador.
O voto de Peterson Simão também foi favorável à inegibilidade de Castro e Bacellar por oito anos (a partir de 2022), bem como pagamento de multas no valor de R$ 106,410 mil para ambos. Para Pampolha, foi indicada multa de R$ 21,292 mil reais.
Eles são acusados das práticas de abuso do poder político, econômico e de autoridade, em ano eleitoral, diante de duas ações: a primeira, dando conta de um esquema de contratação de funcionários fantasmas na Fundação Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro (Ceperj) em 2022, à época ligada à secretaria de Governo, então chefiada por Rodrigo Bacellar.
A segunda ação, conduzida pelo MPF, mirava o mesmo esquema, desta vez feito por meio de contratações pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A “folha de pagamento secreta” envolveu 27 mil nomeações na Ceperj e 18 mil na Uerj, segundo as investigações.
Ainda de acordo com o MP, mais de R$ 275 milhões em espécie foram sacados na boca do caixa.
“Saques na boca do caixa para pagamentos milionários em espécie divididos em pequenas parcelas aos beneficiários fizeram com que a contra prestação do serviço ficasse prejudicada e não fiscalizada, É uma espécie de pagamento ultrapassada, pois beneficia práticas fraudulentas e fiscalização por órgãos competentes, não se podendo ignorar que foram justamente esses os intuitos dos réus”, declarou o relator.
As investigações apontam que os esquemas foram executados para usar a máquina do estado para benefícios eleitorais.
Julgamento:
O julgamento foi iniciado pelo corregedor regional eleitoral, desembargador Peterson Barroso Simão – relator do caso – com a leitura do relatório das ações. Em seguida, o presidente do TRE-RJ, desembargador Henrique Figueira, concedeu a palavra à acusação, feita pela coligação “A Vida Vai Melhorar” – derrotada nas eleições de 2022, com Marcelo Freixo como candidato.
Em seguida, a procuradora regional eleitoral Neide Cardoso, reforçou o conteúdo da denúncia do Ministério Público Federal, formalizada na última semana. Depois, falaram, respectivamente, as defesas de Castro, Pampolha, e Bacellar e demais réus, entre eles o presidente da Ceperj até agosto de 2022, Douglas Lopes.
Durante seu voto, o relator Peterson Simão indicou que entre 2021 e 2022 a Ceperj ampliou o seu número de projetos de 500 para 2 mil, envolvendo contratações sem publicidade nem qualquer processo de seleção, com recebimento somente na boca de caixa. Ele diz ainda que as nomeações envolveram pelo menos 1040 pessoas de vários diretórios estaduais (apontados como cabos eleitorais), e até mesmo pessoas falecidas.
Simão prosseguiu, apontando que a Uerj também serviu para a contratação de pessoas, entre elas servidores públicos que não poderiam acumular cargos. Ele enfatiza que “os réus usaram e abusaram da máquina pública, praticando condutas vedadas na Ceperj e na Uerj”.
“Tais recursos tiveram a iniciativa da secretaria de Governo, com o objetivo de angariar apoio a todos que pretendiam a reeleição,. Tudo ocorreu sorrateiramente. de forma obscura, com folhas de pagamentos secretas, sem o mínimo de transparência. Foi nítido o caráter eleitoreiro, perturbando a legitimidade e normalidade de um pleito de grande dimensão. Quem arquitetou e inventou esse plano perverso é um gênio, mas um gênio do mal”, destacou.
Rodrigo Bacellar
O desembargador relator deu sequência à sua análise, pontuando que as alegações finais do MP apontam o deputado estadual Rodrigo Bacellar com forte participação no esquema.
“O réu teve amigos íntimos e familiares contratados em seu reduto político, Campos dos Goytacazes, sem qualquer transparência. O senhor Rodrigo Bacellar foi secretário de governo até abril de 2022, quando um decreto do governador modificou toda a finalidade e destinação da Ceperj. Portanto, sabia de todos os acontecimentos. Sabia da folha de pagamento secreto e que os pagamentos seriam realizados na boca da caixa, sabia do alto volume de pagamentos realizados em Campos”, e discorreu:
“Ao ver a dimensão danosa do decreto do governador, o senhor Rodrigo Bacellar logo providenciou a sua saída do Governo agindo com dolo intensivo, por ter ciência dos fatos e se retirar, visando claramente proveitos eleitorais posteriores. Antes mesmo do decreto, o secretário de Governo já fazia distribuição ilegal de dinheiro público através da Uerj. No caso da Uerj, o Tribunal de Contas do Estado verificou um aumento vultuoso no repasse dos valores para o projeto Segurança Presente entre 2021 e 2022. Tal discrepância chamou atenção do TCE-RJ, que verificou que o volume liberado no ano de 2022 foi de R$ 141 milhões, cinco vezes maior do que no ano anterior. Isso feito em ano eleitoral”, completou.
Em nota, assessoria de Bacellar afirmou que o deputado confia na Justiça e vai demonstrar, assim que instado no processo, que não houve qualquer irregularidade ou culpabilidade em sua condução na Secretaria de Governo. O posicionamento acrescenta ainda que:
“Não houve contratação de parentes no período em que esteve no Governo. Apenas uma pessoa com parentesco por afinidade foi contratada, após a desincompatibilização de Rodrigo Bacellar do cargo de Secretário, em maio 2022, saindo em julho de 2022, antes do retorno de Rodrigo Bacellar no cargo de Secretário de Governo após pleito eleitoral de 2022”, complementa.
Veja mais trechos do voto do desembargador relator do caso, Petersom Simão:
“É evidente a responsabilidade direta do governador e do então presidente da Ceperj, que praticaram, mandaram praticar ou permitiram intencionalmente que fossem praticada conduta ilícita, objetivando a releição com sucesso, com distribuição de fortunas simpatizantes, gerando altíssimo prejuízo ao erário público e portanto à população fluminense. Tal situação, quebrou a igualdade de oportunidade dos demais candidatos e influenciou na livre escolha dos eleitores em dimensão desproporcional. Tudo foi muito bem planejado, obedecendo a sequência do calendário eleitoral com bastante antecedência. Valendo observas as quantias gastas pelo Ceperj nos anos de 2020 e 2021 e comparando com a elevadíssima quantia alusiva ao ano de 2022.”
“A ceperj foi criada por lei em 2009, com finalidade própria. Em 9 de março de 2022 – aproximadamente sete meses antes do pleito eleitoral – alterou completamente a destinação da fundação. Ela foi criada por lei e um decreto modificou completamente a sua finalidade e Injetou dinheiro público em ano eleitoral. O decreto feriu o princípio da legalidade da administração pública, à medida que teve como finalidade única modificar legalizar atos ilícitos já praticados e os que viram a ser. Ceperj passou a celebrar milhares de contratos mediante interesse do governador, seu vice e aliados políticos, tornando-se uma distribuidora de dinheiro público em ano eleitoral”.
“Analistas e fiscais do Tribunal de Contas do Estado apontam que as contratações eram feitas sem critério e dificultando o acesso à informação e fiscalização. Com folhas de pagamentos secretas, eram contratadas pessoas de outros estados e até presidiários. Pagamentos eram feitos na boca do caixa, sem acompanhamento dos projetos nem da frequência dos prestadores de serviço”.
“Testemunhas revelaram em depoimento que foram contratadas sem nenhum processo seletivo, sem assinar contrato, recebiam sem contra-cheque, recebiam menos do que o combinado, trabalhavam como cabos eleitorais, e alguns do projeto sequer aconteciam de fato”.
“Depoimentos das testemunhas revelam que elas foram obrigadas a participar de verdadeira campanha política, buscando angariar votos para os réus Cláudio e Thiago. Saques na boca do caixa para pagamentos milionários em espécie divididos em pequenas parcelas aos beneficiários fizeram com que a contra prestação do serviço ficasse prejudicada e não fiscalizada. Foi nítido o caráter eleitoreiro, perturbando a legitimidade e normalidade de um pleito de grande dimensão”.