Em meio ao retorno dos barracos no Centro de Campos, tema abordado pela reportagem especial do J3News no último domingo (14), a doutora em Serviço Social, pesquisadora e professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), Leda Barros, afirma que a dificuldade de acesso a abrigos para pessoas em situação de rua não é apenas falta de vaga, mas resultado de um sistema que trata as consequências, e não as causas da exclusão social.
Segundo ela, a cidade tem hoje cerca de 130 pessoas em situação de rua, número próximo ao registrado no primeiro censo municipal, de 2022, quando a Prefeitura identificou entre 122 e 130 pessoas nessa condição. Ainda de acordo com a pesquisadora, Campos tem uma média de 90 vagas nas instituições públicas e entre 10 a 15 na instituição cofinanciada.
“Quando as condições e situações sociais são tratadas sem que as raízes e origens sequer sejam tocadas, há de fato sempre um vácuo entre a quantidade de pessoas em situação de rua e a capacidade institucional. O que digo sobre isso é que uma vez que as razões para irem às ruas são apenas tangenciadas com serviços básicos e nos mínimos das necessidades sociais, a tendência é que se prevaleça essa relação de incompletude das vagas nas instituições que devem ser de curtos períodos de permanência”, afirma.
“Projetos com serviços de inclusão produtiva (geração de emprego e renda), inclusão habitacional, planos estratégicos de trato da dependência química à substâncias psicoativas, inclusão educacional, de curto e médio prazos são fundamentais para as portas de saídas das instituições, e consequentemente das ruas”, completou.
Entre idas e vindas, a sensação de violência
Em meio à rotina invisível para muitos, a história do “casal do Cais da Lapa” (ilustrado na foto do início) chamou a atenção. Ana Nobre e Vítor, acompanhados pelo J3News há mais de um ano, simbolizam a complexidade do tema. Juntos há 16 anos, vivem em barracos improvisados, entre idas e vindas, em diferentes áreas da cidade. Para Ana, o problema, além da falta de políticas, é também a forma como as ações de retirada são conduzidas.
Leda destaca que a invisibilidade social convive com momentos de visibilidade “quando interessa aos sistemas”, o que, segundo ela, favorece práticas de retirada forçada e opressão institucional. “Há não só preconceito como há a banalização de sua existência, algo que nos remonta à antiguidade. Por isso a visibilidade e invisibilidade são movimentos contraditórios, carregados de estereótipos. Sobre as opressões institucionais com as práticas de retirada de seus pertences assim como violência física, e, da própria sociedade, elas são associadas ao total desrespeito humano para com a pobreza e toda a sua trajetória brasileira, envolvendo trabalhadoras e trabalhadores”, diz.
Para a especialista, o enfrentamento exige ações intersetoriais de saúde, habitação, educação e geração de renda. “As portas de saídas das ruas requerem múltiplas ações das políticas públicas brasileiras, com muito foco em ações intersetoriais das políticas de saúde, habitacional, geração de emprego e renda, educacional, entre outros. No emergencial é o que já vem sendo feito: acolhimento Institucional com acréscimo de vagas, se necessário for. Estímulo para o ingresso institucional aqueles que estão na rua ou coberturas protetivas sociais móveis. A perspectiva é assegurar o trato contínuo às raízes que os levam à situação de rua”, conclui.