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Cresce o número de mortes por mal súbito

Dor no peito, falta de ar, palpitações e desmaio são os sinais mais comuns

Especial J3
Por Ocinei Trindade
11 de agosto de 2024 - 7h01
Emergência|Bombeiros receberam mais de 600 chamados em Campos para atendimento de eventos clínicos (Fotos: Silvana Rust)

Os casos de mal súbito em pessoas de diferentes idades tendem a aumentar no período de  inverno. Em Campos dos Goytacazes, o cirurgião cardíaco Pedro Conte coordena a Emergência do Hospital Geral Dr. Beda. Ele diz que, semanalmente, neste período, pode atender a cerca de quatro pacientes com infarto mais grave. De acordo com o Corpo de Bombeiros, de janeiro a julho de 2024, foram 627 chamados de emergência para eventos clínicos. Destes, 89 acionamentos foram realizados com esse tipo de ocorrência. Segundo a Organização Mundial da Saúde, a morte súbita, ocasionada pela cardiopatia isquêmica, lidera o número de óbitos no mundo anualmente, sendo responsável por quase 30% das mortes no Brasil, cerca de 320 mil pessoas. Especialistas consideram que medidas preventivas podem reduzir o índice.

Cirurgião Cardíaco|Pedro Conte

“Nesta fase do ano, é comum ter um número aumentado de pacientes com o quadro de infarto agudo do miocárdio. Como fica mais frio, o organismo precisa manter o metabolismo um pouco mais acelerado. Então, a frequência cardíaca e a pressão tendem a aumentar. O próprio vaso coronariano tende a ter um espasmo maior; a viscosidade do sangue acaba modificando também. Se a gente comparar o verão com a época de inverno, verifica-se que no inverno é mais comum ter infarto. Boa parte das causas de morte súbita acabam sendo causas isquêmicas cardíacas. Por algum motivo, o indivíduo faz alguma arritmia e acaba tendo morte súbita”, explica o cirurgião cardíaco Pedro Conte.

A hipertensão arterial costuma ter algum tipo de implicação em fatores de risco para infarto ou doença aterosclerótica. “Toda vez que a gente fala em risco cardiovascular, hipertensão, dislipidemia, diabetes, tabagismo, obesidade, sedentarismo, eles acabam entrando como fator de risco para esses eventos”, explica o coordenador da Emergência do Beda. “Existem também outras causas de morte súbita. Entre as possibilidades, dissecção de aorta, aneurisma de aorta, roto. Qualquer outra alteração de grandes sistemas vasculares pode estar causando a morte súbita”, complementa.

Cardiologista|Elias Yunes (Foto: Josh)

Dor no peito, falta de ar, palpitações e desmaios costumam ser os sinais mais comuns de doença cardíaca. Um médico deve avaliar o paciente com esses sintomas. O cardiologista e diretor do CardioBeda, Elias Yunes, diz que a morte súbita na imensa maioria das vezes ocorre por uma causa relacionada ao coração. “Isso pode ocorrer por alguma doença adquirida, como a doença coronariana, a causa mais frequente. Outras vezes, por alguma causa genética, muitas vezes difícil de ser diagnosticada precocemente. Não podemos esquecer de possíveis fatores externos associados, como o uso de drogas. O risco de morte súbita aumenta com a idade e é mais elevado em homens. Mas, temos visto um número crescente e alarmante de eventos em pacientes jovens”, diz.

Para Yunes, é crucial aumentar a conscientização sobre os fatores de risco. “O histórico pessoal e familiar de doenças cardíacas subjacentes, além de incentivar exames preventivos regulares, especialmente nessas pessoas com histórico familiar de problemas cardíacos. É muito importante não negligenciar sintomas como dor no peito e falta de ar, buscando ajuda o quanto antes. A educação sobre técnicas de ressuscitação cardiopulmonar (RCP) pode desempenhar um papel fundamental em salvar vidas em casos de emergência em paradas cardíacas fora do ambiente hospitalar. Qualquer pessoa pode receber esse treinamento”, diz.

Riscos e prevenção
De acordo com especialistas fazem parte dos grupos de risco de sofrer um mal súbito ou parada cardíaca, pacientes com doença coronariana; arritmias cardíacas; doenças do músculo cardíaco (miocardiopatias); insuficiência cardíaca.  Para diminuir os riscos de aterosclerose, devem ser combatidos e tratados os fatores como hipertensão, diabetes, colesterol elevado, sedentarismo, tabagismo. Alimentação saudável, exercício e acompanhamento periódico são a base da prevenção.

Há menos de um ano, o jornalista aposentado Luiz Cândido, de 78 anos, não se sentiu bem fisicamente e procurou a Emergência do Hospital Dr.Beda. Ele toma remédios para diabetes e hipertensão. Durante exames sanguíneos, verificou-se que suas taxas de colesterol e creatina estavam alteradas. Após novos exames, foram constatados problemas de artérias coronárias entupidas.  Ele foi submetido ao procedimento de cateterismo, método para detectar e remover acúmulos de placas de gordura ou lesões nestas regiões. “Havia dois entupimentos em uma artéria. Após o cateterismo, eu continuo mantendo o tratamento e os remédios. Procuro fazer uma caminhada dentro dos meus limites. Evitar alimentação pesada com muita gordura. Aconselho a quem tem esses problemas de levar uma vida mais saudável, dentro das suas limitações e evitar o estresse. Acho que é muito importante. Eu venho geralmente uma vez ao médico que recomenda exames para sempre ficar prevenido diante de alguma alteração. Prevenir é melhor do que remediar”, revela.

De acordo com o médico Elias Yunes, consultar um especialista em cardiologia regularmente pode ajudar na identificação precoce de condições cardíacas que podem predispor à morte súbita. “Isto estará permitindo intervenções adequadas que nunca serão uma garantia de 100%, mas podem reduzir bastante o risco. Existem ferramentas importantes para se calcular o que chamamos de risco cardiovascular de um paciente e traçar as metas individualizadas de controle e prevenção. A forma mais importante de reduzir esses índices é intensificar as medidas preventivas”, afirma.

Aos 73 anos, o comerciante Jorge Mothé é paciente renal. Sabendo dos problemas de saúde, procura se cuidar. “Faço exames periódicos. Acho importante prevenir problemas, inclusive mal súbito”, conta. Cuidar da saúde é um dos objetivos do casal de aposentados Josete e Moacir Almeida, de 78 e 81 anos, respectivamente. “A cada seis meses, vou à cardiologista. O coração está indo bem, mas o joelho anda dolorido. Estou cuidando de mim e do meu marido. Procuro vigiar a alimentação dele, pois ele é meio guloso e não pode”, brinca a idosa. A filha do casal, Camila, também busca prevenir doenças: “Eles têm uma preocupação em fazer os exames regularmente. Ambos são bem obedientes. Eu acho que para a população de um modo geral, principalmente nessa idade que eu estou, de 45 anos, exames médicos são importantes. Faço acompanhamento com cardiologista. Quanto mais cedo a gente detectar um problema, melhor”, afirma.

SOS CORAÇÃO
Em Campos dos Goytacazes, o projeto “SOS Coração” passou a ser executado há menos de dois anos e já salvou a vida de mais de 300 pacientes do Sistema Único de Saúde. Idealizado pelo cardiologista Jamil Soares, começou a ser executado na gestão do ex-subsecretário de Saúde, Dr. Maninho. O objetivo é proporcionar atendimento rápido e eficaz às vítimas de infarto agudo do miocárdio, e realizar intervenções salvadoras dentro de uma janela crítica de uma hora após o evento. O projeto foi integrado à rede pública da cidade e trouxe  uma mudança significativa na forma como casos de infarto são tratados na região.

O SOS Coração foi reconhecido externamente. Recebeu a terceira colocação na premiação da Fiocruz na 4ª Mostra Estadual de Práticas de Saúde, destacando-se entre iniciativas do estado do Rio de Janeiro. Integrantes do projeto defendem que os infartos precisam ser tratados na primeira hora. Antes do projeto, pacientes esperavam até 10 dias na rede pública para receber tratamento adequado. A finalidade é que eles cheguem rapidamente ao hospital terciário para serem tratados de forma eficiente. Quando atendidos na primeira hora, os resultados são significativamente melhores, com menor perda de músculo cardíaco e melhor prognóstico.

O Hospital Ferreira Machado é a maior referência no atendimento de urgência da região. Para o superintendente da unidade, Guilherme Rangel, o SOS Coração tem feito toda diferença para os casos de infarto agudo de miocárdio. ´”É a doença que mais mata no país e no mundo, dando um desfecho muito mais otimista para o paciente que se enquadra nesta situação. Atentamos para o potencial de práticas inovadoras que podem ser relativamente simples, mas decisivas para salvar o paciente. A sensibilidade do gestor de saúde altera o desfecho para o beneficiado lá na ponta “, diz.

Para o cardiologista Pedro Conte, prevenir situações de mal súbito é possível. “No Setor de Emergência do Hospital Dr.Beda, em relação ao combate à morte súbita, todos os funcionários, médicos, enfermeiros e técnicos têm treinamento para isso. Utilizamos técnicas de reanimação, revisão cardiopulmonar, que é crucial para pacientes nesse quadro. A recomendação básica é controlar os fatores de risco e deixar a saúde em dia. Exames de rotina, o famoso check-up, devem ser acompanhados por um cardiologista regularmente, para avaliar como está o funcionamento cardiovascular”, afirma. Em Campos, a Santa Casa e o Hospital Escola Álvaro Alvim possuem serviço especializado em tratamento do infarto agudo pelo SUS. O projeto SOS Coração organizou e integrou as estruturas que já existiam.  A cada 24 horas um profissional intervencionista fica disponível por telefone e on-line para receber o contato a respeito do paciente e avaliar o caso. Diante de uma situação emergencial, o médico autoriza a transferência do paciente, independentemente de regulação de vaga. Antes, a burocracia vinha antes do paciente e isso atrapalhava todo o processo.