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Pesquisador analisa situação preocupante das lagoas de Campos e região

Vinícius Lima é doutor em Geografia e professor de pós-graduação Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Estadual do Norte Fluminense

Meio Ambiente
Por Ocinei Trindade
1 de julho de 2024 - 12h57
Vinicius Lima é pesquisador da Uenf (Reprodução)

Em publicação recente do J3News, a reportagem “Lagoas de Campos: três cartões postais sob ameaça” (leia aqui) tem a participação do pesquisador Vinicius Lima. Ele é doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense. Atualmente, é professor de pós-doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais da Universidade Estadual do Norte Fluminense. Entre seus interesses, destacam-se os temas: Geomorfologia Fluvial e Lacustre; Geotecnologias Aplicadas à Bacias de Drenagem; e Análise Ambiental. Nesta entrevista exclusiva, o cientista analisa a preocupante situação das lagoas de Campos dos Goytacazes e região.

Como observa a situação das lagoas de Campos e região?

Para responder essa pergunta é interessante que coloquemos a leitura na ótica da evolução da paisagem. Além disso, devemos também entender que lagoas são sistemas que não necessariamente obedecem aos limites político-administrativos, seja do município, estado ou da Federação. Nosso maior exemplo é a Lagoa Feia, que abrange parcialmente os municípios de Campos dos Goytacazes e Quissamã. Dito isto, cabe lembrar que o município de Campos e os demais municípios que compõem a região Norte Fluminense formam a “verdadeira” região dos Lagos. Isso porque ainda existem em nossa região algo em torno de 74 lagoas e lagunas.

Lagoa Feia, em Campos

Quando colocamos na perspectiva da evolução da paisagem, podemos dizer, sem margem de dúvidas, que as lagoas de Campos e região se encontram em condições bem piores do que estavam até a metade do século passado, por exemplo. Isso porque boa parte delas foram drenadas por obras de engenharia realizadas durante da Ditadura Militar por um órgão chamado Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS), extinto no governo Collor. A missão do DNOS era resolver os problemas que envolviam inundações e doenças de veiculação hídrica. Esse foi, pelo menos o argumento utilizado à época. O que estava por fundo era, na verdade, a pressão da elite agrária de Campos para se ampliar as áreas de cultivo de cana-de-açúcar e expansão dos campos de pastagem.

Nossas lagoas nunca foram protegidas e as alterações humanas na paisagem têm gerado cenários nada positivos. Construção de diques, construção de canais que conectam uma, duas, três lagoas sem o devido manejo, além do despejo de efluentes e o descarte de resíduos são alguns dos impactos antrópicos nesses ecossistemas. A Lagoa Feia, que já teve uma área superior a 370 km², atualmente possui 200 km², ou seja, foram perdidos 170 km² de superfície líquida daquela que é a maior lagoa de água doce do Estado do Rio de Janeiro. Reitero que essas alterações na paisagem lacustre da região se deram com o aval legal e, ainda hoje, não há mecanismos de proteção. 

Sobre a Lagoa do Vigário, por exemplo, o que mais chama à atenção sobre esse recurso natural em termos de problemas?

Minhas pesquisas são voltadas à forma com que as sociedades humanas se relacionam com o meio bio-físico. No caso da Lagoa do Vigário, temos artigos onde avaliamos os múltiplos usos da terra (urbano, pastagem, agricultura, mineração etc) e das águas (pesca, banho, esporte etc), não só da Lagoa do Vigário, mas também das demais lagoas da margem esquerda do Rio Paraíba do Sul.

Lagoa do Vigário, em Guarus

O que me chama atenção é que a Política Nacional de Recursos Hídricos nos diz que a gestão das águas deve ser feita de forma integrada. Para tanto, é necessário diálogo entre a sociedade civil, o poder público e a universidade. Qualquer transeunte na Lagoa do Vigário irá se deparar com a poluição. Mas o que mais me chama atenção é o alto grau de adensamento urbano daquela região e os riscos a isso associados, como inundações, por exemplo. Inclusive recentemente participei de uma banca de mestrado onde o autor apontava exatamente isso, o alto risco às inundações naquela região, visto que a Lagoa do Vigário é um meandro abandonado do Rio Paraíba do Sul. Sua proximidade com o rio, além da baixa declividade do relevo, e por se encontrar numa planície fluviomarinha, a colocam em posição de risco ao desastre natural.

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Há soluções para estas lagoas?

Sempre há soluções. A grande questão é quanto e quem pagará. O Poder Público no Brasil está atrasado quando o assunto é recuperação de ambientes alterados. Isso porque nossa história é a de tentar corrigir a natureza e não a de entender a dinâmica do ambiente. Nós precisamos pensar em soluções baseadas na natureza, respeitando seus limites e potenciais de usos.

Lagoa de Cima

As faixas marginais de proteção (FMP) das nossas lagoas, incluindo a Lagoa do Vigário, são insuficientes enquanto mecanismos de proteção. Além disso temos também estudos onde sugerimos uma nova demarcação respaldados pelas características geomorfológicas desses ambientes. As soluções são sempre complexas, uma vez que envolve remoção de pessoas e todos os problemas decorrentes disso. Ainda, todos os rios e lagoas da nossa região estão conectados direta ou indiretamente, sejam por águas superficiais, sejam por águas subsuperficiais. A água do Rio Paraíba do Sul, em sua margem direita, é drenada, por um sistema de canais artificiais, para a Lagoa Feia ou para o Canal da Flechas e deste para o mar.

Parque Municipal Lagoa do Vigário

Já a água do Rio Paraíba do Sul, em sua margem esquerda, é drenada por outro sistema de canais artificiais para a Lagoa do Campelo, e deste para o canal Engenheiro Antônio Resende, e então para o mar. Ou seja, qualquer solução deve ser pensada no âmbito da bacia de drenagem do Rio Paraíba do Sul, não apenas de uma lagoa pontualmente. As recomendações envolvem replantio de mata ciliar, manejo adequado do solo, gestão integrada dos recursos hídricos e renaturalização de rios e lagoas.