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Prefeitura de Campos lança edital para o novo mercado

Secretário de agricultura promete diálogo, mas projeto preocupa feirantes e entidades ligadas ao patrimônio histórico e arquitetônico

Especial J3
Por Cíntia Barreto
4 de fevereiro de 2024 - 5h01
Praça da República|Licitação para construção do Complexo Comercial dos Feirantes está marcada para o dia 7 deste mês (Foto: Gabriel Carvalho)

A Prefeitura de Campos dos Goytacazes abriu licitação, no último dia 30, para a construção do Complexo Comercial dos Feirantes na centenária Praça da República. A informação surpreendeu grande parte dos feirantes, instalados no anexo do Mercado Municipal, que serão impactados de forma direta pelas mudanças decorrentes do empreendimento. Entidades como o Conselho de Preservação do Patrimônio Arquitetônico Municipal (Coppam), Conselho de Arquitetura e Urbanismo (Cau), Associação Norte Fluminense de Engenheiros e Arquitetos (Anfea), também alegam não ter sido informadas sobre o projeto.

A construção da Nova Feira de Campos, segundo a publicação no Diário Oficial do Município, foi anunciada com valor previsto para a obra de R$ 18.994.039,00. O projeto prevê a construção de uma ampla estrutura contendo 5.450 metros quadrados com 381 baias para feira livre, mais 68 para peixaria, 13 pontos de açougue e outros sete de restaurante, além de uma praça de alimentação externa e estacionamento.

Estrutura|Projeto que será instalado na Praça da República tem valor de quase R$ 19 milhões e 5.450m² (Foto: Divulgação)

À primeira vista, o projeto apresenta uma possibilidade de promover uma grande virada no eixo comercial do Centro de Campos, podendo ser extremamente positivo. No entanto, a ausência de discussão por parte do poder público municipal em relação ao projeto aflige também as entidades envolvidas, principalmente pela proposta de uma profunda mudança na área central da cidade. Além da alteração de endereço da Feira Livre e da Peixaria do Mercado Municipal, que em 1981, na gestão do então prefeito Raul Linhares, ocupam a área do entorno do prédio do Mercado, na estrutura metálica que existe até hoje, conforme destacou a historiadora Graziela Escocard.

Feirante| José Ricardo Coutinho (Foto: Silvana Rust)

José Ricardo Coutinho é feirante há mais de 40 anos, diz estar preocupado com o que vai acontecer. “Estamos aguardando a prefeitura nos explicar sobre esse novo local. Minha preocupação é ir para um novo espaço e perder o movimento natural que tem aqui com as bancas do mercado e o camelódromo”, contou.

Gabriel da Silva trabalha no mercado junto com o pai com a venda de animais desde criança. Segundo ele, nenhuma informação que circula entre os feirantes é oficial. “Ouvi dizer que nesse novo complexo não poderá ter animais. Se isso for verdade, eu não sei o que vou fazer da minha vida. A falta de informação nos deixa preocupados”, disse o feirante.

Peixaria|Jonas Gonçalves (Foto: Silvana Rust)

Já o peixeiro, Jonas Gonçalves, expressou curiosidade sobre o projeto: “Não sabemos quase nada sobre isso, mas pelo o que vi na imprensa, parece ser algo legal. Se for para nos dar melhores condições de trabalho, acho válido”.

Assim como os feirantes, o arquiteto e diretor da Anfea, Davi Fernandes, afirmou não estar ciente do projeto. “Tudo que sei sobre este assunto, soube pela imprensa. Pelo o que parece, o prédio vai ocupar parte da praça. Acredito que a área verde será mantida em sua grande parte. O que mais preocupa são os impactos no local porque ele já tem um fluxo consolidado em volta. A chegada e saída de caminhões, carga e descarga, a própria chegada e saída do público; descida da rua Barão de Amazonas, o fluxo de veículos, o fluxo da rodoviária antiga, enfim, não temos informação sobre como foi pensado o impacto da região”, destacou.

O arquiteto ainda acrescentou que entende a necessidade da mudança dos feirantes para um local apropriado, mas questiona a falta de um debate. “Entidades como o Cau, a Anfea, o Coppam, possuem profissionais que vivenciam e trabalham na área de planejamento e construção, então, eles podem contribuir ainda mais para o desenvolvimento desse projeto. Por exemplo, o Coppam é composto por pessoas que pensam sobre a parte histórica do município. No Cau, existem pessoas técnicas de apoio. Na Anfea, são os engenheiros-arquitetos que também trabalham, muitas vezes, em órgãos públicos e tem uma visão um pouco diferente. Então, essa troca de informações e de ideias das entidades são essenciais para a progressão do projeto. Quando ela não ocorre, é uma situação que gera um agravante, gera questionamentos sobre quem está tomando as decisões referentes ao projeto e o porquê delas”, explicou o diretor da Anfea.

Conselheiro Estadual do Cau, o arquiteto Gustavo Manhães, também afirma não ter recebido informação sobre o projeto: “Vale ressaltar que o Conselho precisaria ser provocado para “participar” do debate. Não houve uma aproximação para uma conversa com o Conselho. Como autarquia federal, temos por dever zelar pela sociedade. O Conselho está sempre de portas abertas para todo e qualquer debate que possa contribuir com o município e seus munícipes”, destacou.

Praça da República é tutelada pelo Coppam
A Praça da República, chamada anteriormente de Praça do Imperador, é de 1847, de acordo com a historiadora Graziela Escocard. O local é tutelado pelo Coppam, órgão responsável por preservar os equipamentos históricos culturais de Campos.

Praça da República| Área receberá estrutura com 381 baias para feira livre, 68 para peixaria, 13 pontos de açougue e outros sete de restaurante, além de uma praça de alimentação externa e estacionamento (Foto: Silvana Rust)

Sobre o projeto de construção da Nova Feira, ainda de acordo com Auxiliadora, não houve por enquanto a comunicação do poder municipal sobre qualquer mudança na praça histórica. “É necessária uma análise do projeto, mas a informação ainda não chegou oficialmente ao Coppam. Tenho visto algumas articulações dos conselheiros em relação a isso, acredito que eles vão solicitar mais informações sobre o projeto”, informou.

Para o Conselheiro da Anfea, Gustavo Manhães, seria interessante que o local escolhido para a implantação da feira fosse reavaliado, uma vez que Campos tem espaço para expandir. “Acredito que a nova estrutura física para feirantes e usuários seja importante, porém não vemos a localização como uma das melhores. E, por não conhecer o projeto a fundo, não temos dados para uma análise mais criteriosa. Entretanto, vemos que a preservação de espaços verdes remanescentes é de suma importância para a cidade, que é o caso da Praça da República. Acho que Campos, sendo uma planície, tem áreas mais bem localizadas para implantar esse novo modelo de serviço”, avaliou.

Secretaria de Agricultura defende local para a implantação do complexo
Para o Secretário de Agricultura de Campos, Almyr Júnior, a construção do Complexo Comercial dos Feirantes resolveria um problema antigo: a recuperação do Mercado Municipal, dando visibilidade ao prédio histórico, e destinando o imenso espaço da Praça da República, que deixaria de ser centro de convivência para se transformar em um equipamento de atividade econômica.

Estrutura|Inaugurado em 1921, Mercado Municipal possui um galpão metálico que já está há mais de 40 anos ao lado do prédio original (Foto: Silvana Rust)

A intenção, segundo ele, é liberar a fachada centenária do Mercado Municipal, mas, antes, é preciso construir um local apropriado para receber os feirantes. “É preciso reformar o Mercado Municipal e dar a ele todo o valor que merece. A feira ao lado do mercado foi colocada de forma paliativa há mais de 40 anos, fechando a fachada do Mercado. A praça fica há 250 metros do Mercado Municipal e é um local de fluxo livre. Isso vai ampliar a capacidade de comércio do Centro” explicou.

O secretário ainda destacou que esse projeto também pode dar maior funcionalidade à praça, que, atualmente, não tem seu espaço bem aproveitado. “O projeto prevê um local amplo para feira grande, peixaria de qualidade, açougue de qualidade, um mezanino, praça de alimentação e um banco de alimentos, fundamental para o programa de aquisição de alimentos, a fim de distribuir alimentos para as pessoas mais vulneráveis. Além disso, entre as avenidas XV de Novembro e 28 de Março, vamos ter um novo espaço, com um projeto de qualidade que ajuda a agricultura, pecuária, pesca e o turismo na nossa cidade”.

O secretário salientou ainda que algumas árvores que hoje estão no local, não poderiam ter sido plantadas por questões ambientais. Entretanto, a maior parte delas será mantida. “É importante deixar claro que nós estamos abertos para o debate e propostas alternativas”, finalizou.