O transporte público é, com certeza, um dos grandes problemas que as últimas administrações municipais vêm enfrentando em Campos. Com estratégias diversas para tentar atender às demandas da população, nos últimos anos, nenhuma se mostrou eficaz para que, de fato, as pessoas tenham um transporte de qualidade, com cumprimento de horários, opção de itinerários e uma frota bem conservada. Sem poder contar com o funcionamento pleno do serviço, muitas pessoas têm optado por utilizar o próprio veículo, como bicicletas, motos e motonetas para ir para o trabalho, principalmente na parte da manhã, quando os ônibus e vans costumam circular lotados. Os famosos carros de “lotada”, táxis e carros de aplicativo também são opções cada vez mais utilizadas. A Prefeitura de Campos afirma que vem estudando um novo modelo de transporte, com três estações de integração, duas em construção e mais uma, que ainda terá as obras iniciadas.
Nos pontos de ônibus pela manhã, é fácil encontrar trabalhadores que têm histórias diversas sobre a precariedade de serviços de ônibus e vans para contar. Eles relatam as dificuldades diárias enfrentadas por eles para conseguir chegar ao trabalho. Márcia Alvarenga mora no Parque Prazeres e trabalha na área da Pelinca. Para ir para o trabalho, ela conta que precisa chegar muito tempo antes ao ponto de ônibus, porque muitas vezes, os coletivos passam muito cheios e às vezes não param para pegar mais passageiros. “Ainda tem o problema do RioCard, que nem todos os ônibus aqui recebem pelo cartão, uma empresa recebe e a outra não, aí se a gente entrar num ônibus desses que não recebe já dá a maior trabalheira, tem que pagar a passagem do bolso ou descer.”, relata a passageira.
Ela também conta que conhece muitas pessoas que moram no bairro vizinho, o Usina São João e enfrentam problemas parecidos. Segundo ela, para lá, só há cinco horários por dia, isso de segunda a sexta-feira, porque aos fins de semana, os moradores não sabem os horários exatos do transporte coletivo. “É muito comum as pessoas terem que vir a pé, à noite, no escuro para poder pegar a condução”, relata. “Eu, enquanto usuária do transporte, vejo fiscal olhando a questão dos carrinhos de lotada, mas não vejo o IMTT atuando com relação aos horários e a lotação dos ônibus”, se queixa.
No distrito de Travessão a realidade é a mesma. Carla Ribeiro, comerciária, diz que de segunda a sexta pega ônibus e vans bem cheios para se locomover para o trabalho, mas que aos finais de semana a população não tem horários exatos para pegar a condução, não podendo fazer uma programação contando com o transporte público. “A gente fica dependendo de usar carro de aplicativo, não tem outro jeito”, relata.
A escassez de ônibus circulares é outra questão que afeta os usuários. Carla, que está com a mãe internada no HGG, para vir acompanhar a mãe tem que descer próximo à Rodoviária Roberto Silveira e voltar para Guarus, em outro coletivo, porque vindo de Travessão ela não tem outra opção para chegar à unidade de saúde.
A equipe de reportagem encontrou na Avenida José Carlos Pereira Pinto, em frente ao Hospital Geral de Guarus, George Augusto descendo do ônibus que faz a linha Santa Rosa x Jóquei. Ele mora no Santa Rosa e trabalha na avenida e conta que todos os dias pega a condução lotada. “É assim todos os dias, desde cedo, por volta das 7h os ônibus já passam cheios e eu, sinceramente, já não tenho muita esperança de melhorar não”, lamenta o trabalhador. Na mesma avenida é possível ver que táxis fazem o serviço de “lotada” pegando passageiros nos pontos, cobrando o valor de uma passagem de ônibus, deixando os trabalhadores em pontos específicos.
Quem mora na Baixada Campista também enfrenta dificuldades em áreas específicas, como a de Tócos, onde não há ônibus para atender à população, apenas vans. “Diversas vezes nós temos que ir de carro de aplicativo trabalhar, porque, simplesmente, não cabemos na van. Não é suficiente para atender à demanda e mesmo assim o número de vans não aumenta, nem são colocados ônibus para fazer a linha”, conta Cláudia Márcia Arêas, que mora na Pecuária e trabalha na localidade.
No ponto em frente à Rodoviária Roberto Silveira, Ailton Nunes, aposentado por invalidez, utilizando uma muleta sinaliza para um coletivo que não para. Ele relata que não é raro acontecer isso, mas ressalta que a localidade em que ele mora, Santa Cruz, está bem servida de ônibus no momento. “Ficamos muito tempo tendo problema, mas de dois anos pra cá melhorou muito, eles passam no horário, tudo certinho”, relata.
Também na rodoviária, Katriana Azevedo desce da Linha São Benedito com os três filhos. Ela conta que o bairro recentemente passou a ser atendido com uma linha de ônibus e que ficou satisfeita com o serviço. “Fui bem atendida, foi a primeira vez que precisei usar o ônibus com as crianças e fiquei muito feliz em poder utilizar esse direito que é o transporte coletivo”, ressaltou.
Em 2010, no governo de Rosinha Garotinho, foi instituído um programa com passagens a R$ 1 em todo o município, com o restante do valor da tarifa sendo subsidiado pelo poder público. O programa da Passagem Social foi encerrado em 2017, no governo Rafael Diniz, quando a passagem passou a custar R$ 2,75.
Em 2019 entraram em operação os terminais de integração, que começaram, e permaneceram, com instalações provisórias para o início do Transporte Alimentador, que era feito por vans, saindo de pontos diversos da cidade e fazendo a integração de passageiros através de terminais. O sistema não foi adiante, apresentando problemas, tanto com relação à integração, como dificuldades técnicas, como ocorreram com o insucesso do Cartão Anda Campos – que permitia a integração do usuário que desembarcava da van e embarcava no ônibus pagando apenas uma vez.
Questionada sobre os problemas relatados pela população, a Prefeitura de Campos respondeu por meio de nota que: “Os terminais de integração do novo sistema de transporte público que será implantado no município estão com 50% das obras concluídas. Em Donana, na Baixada Campista, os trabalhos entram na reta final e atingem 85% de conclusão. No Parque Canaã, 65% da obra foi executada. Em Ururaí, os trabalhos serão iniciados agora, pois, houve alteração da área definida para a construção do terminal após um pedido dos moradores atendido pela Prefeitura”.
Ainda segundo a Prefeitura, o Instituto Municipal de Trânsito e Transporte (IMTT) tem intensificado a fiscalização, com monitoramento por GPS, com as falhas sendo comunicadas aos operadores, que são notificados e multados. “As equipes atuam diariamente em diversos pontos da cidade e também no terminal da área central”, diz a nota.
A Prefeitura também afirmou que por meio do subsídio emergencial de óleo diesel, em vigor desde o ano passado, foi que os operadores ampliaram seus atendimentos, incluindo localidades que, há anos, não tinham disponibilidade de transporte. “O IMTT informa que está realizando pesquisa em todas as linhas já existentes na cidade, na Rodoviária Roberto Silveira e em diversos pontos de embarque e desembarque, bem como dentro dos coletivos, para perceber, efetivamente, onde embarca e desembarca cada passageiro, para ajudar a definição do quantitativo de veículos e dos horários necessários para atender às principais demandas. A pesquisa prossegue até setembro e, na sequência, serão lançados os resultados, que irão compor a documentação da revisão do sistema de transporte do município”, finaliza a nota.
Esta semana, o prefeito Wladimir Garotinho vetou o projeto de lei enviado pela Câmara de vereadores, que permitiria a utilização do táxi-lotação. A Prefeitura informou que este modelo de transporte, que existe em alguns municípios, ainda será analisada pelo governo.
Com poucos ônibus para atender a demanda, as bicicletas vêm sendo cada vez mais utilizadas por quem precisa chegar cedo ao trabalho ou à escola. Nas ruas de Campos é fácil notar o número expressivo do veículo em horários de pico, de ida e volta do trabalho. Na ciclovia, na Avenida 28 de Março, o tráfego é intenso sempre a partir das 7h e entre 17h e 19h.
Em 2022, o IMTT traçou o perfil do ciclista de Campos. Os dados mostraram que 74,3% deles utilizam a bicicleta como principal meio de transporte. A frequência semanal de utilização do veículo no município é maior do que a média nacional. Ao todo, 82,1% dos ciclistas pedalam cinco ou mais vezes por semana, enquanto a média nacional é de 72% para a mesma faixa de frequência.
Os resultados do levantamento mostram uma maior concentração de ciclistas na faixa etária de 30 a 39 anos (23,9%), seguida pelos grupos de 40 a 49 anos (21%) e de 20 a 29 anos (19,7%). Durante a pesquisa, foram entrevistados 670 ciclistas, que pedalam pelo menos uma vez por semana como meio de transporte, abordadas pedalando, empurrando ou estacionando a bicicleta.
Estéfani Souza mora no Parque Santa Rosa, ela entra no trabalho às 7h, no Centro da cidade, e após muitos atrasos por conta do ônibus não parar no ponto, porque estava cheio, ela optou por comprar uma bicicleta para trabalhar: “Eu entro cedo no trabalho, e não posso ficar atrasando todo dia. A gente tem compromisso, então vi que a melhor opção era vir de bicicleta, mesmo me cansando mais. Foi a melhor opção pra chegar na hora certa no trabalho”, relata.
Motocicletas e motonetas também são adotadas pelos trabalhadores. De acordo com o IBGE, o município possui 41.937 motocicletas e 13.753 motonetas.