Marusa e Carol trabalham no livro que contará a história de três heroínas de Campos (Foto: Carlos Grevi)
Você sabia que Benta Pereira não liderou o levante de 1748, montada em um cavalo como estamos acostumados a ouvir? Isso porque ela tinha mais de 80 anos e não teria condições de montar a cavalo e comandar um grupo de mais de 500 pessoas. Essas e outras histórias e curiosidades vão estar no livro “Heroínas Campistas”, que está sendo escrito pela professora Ana Carolina Rocha, a Carol Poesia, com a ajuda de outra professora, Marusa Silva. O livro vai contar a história de Benta Pereira, Anita Peçanha (esposa de Nilo Peçanha, ex presidente do Brasil) e de Mercedes Baptista, primeira bailarina negra a se apresentar no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Carol conta que a ideia do livro surgiu durante um evento sobre Mulheres e Negócios, realizado na Universidade Candido Mendes. O encontro foi organizado por Marusa, e nele foi discutida a questão do empoderamento feminino e seus enfrentamentos. A professora explica que se inspirou nas lutas das mulheres para vencerem os preconceitos em áreas majoritariamente ocupadas por homens.
“Como sou da área da Educação, fiquei pensando, nos dias posteriores, em como transformar aqueles discursos em um material palpável, para que pudessem inspirar outras pessoas, para que suas vozes ecoassem para além do evento. Pela minha paixão por literatura, pensei logo em livros. E aí uma coisa levou a outra, eu já sabia que seriam livros contando histórias de grandes mulheres. Então pensei no público-alvo e suas demandas, achei que seria bom se essas mulheres fossem personagens reais da própria história da cidade de Campos. Conversei com a professora Marusa sobre a ideia e a parceria surgiu por afinidades, talentos e afetos, o que tornou o projeto ainda mais engajado e prazeroso”, explica.
Após o projeto ser aprovado, através de um edital da Prefeitura de Campos, para Economia Criativa, começaram os trabalhos. A pesquisa e o resgate historiográfico é a primeira etapa, e, assim como a redação, estão em andamento. A parte da pesquisa ficou por conta de Marusa. “Ela conseguiu materiais raros sobre as personagens selecionadas, realiza o estudo e me manda um texto já resumido. Eu adapto para a linguagem literária”, ressalta Carol.
Quanto à escolha pelas três heroínas, Carol explica que elas romperam preconceitos e foram muito além do que se esperava das mulheres na época. Benta Pereira quebrou paradigmas ao se comportar como uma mulher muito à frente de seu tempo. Anita pertencia a uma família de grande prestígio em Campos, se casou com um homem negro, filho de um padeiro de Morro do Coco e enfrentou a família para viver essa história de amor. E mesmo depois de eleito presidente, a mãe de Anita jamais voltou a se encontrar com ela, sequer conheceu os netos. Já Mercedes Baptista veio de uma infância pobre e lutou muito para ser reconhecida como artista. Foi a primeira bailarina negra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro e dedicou sua vida à dança e à divulgação do “balé folclórico” no mundo.
“As três compõem um quadro temático interessante, sobre o qual gostaríamos de trabalhar. A trajetória da Benta dialoga diretamente com o tema do feminismo, enquanto a história da Anita coloca em questão o racismo e, através da Mercedes Baptista, falaremos sobre a desigualdade social. Todas as três com histórias reais de luta que expõem questões da cultura brasileira que ainda precisam de debate. E todas as três são heroínas porque romperam barreiras, derrubaram imposições e realizaram grandes feitos”, orgulha-se.
Pandemia
A professora Marusa conta que a pesquisa para o livro tem sido feita em fontes documentais, bibliográficas e acadêmicas. Mas, a pandemia acabou atrapalhando o trabalho. Com o Arquivo Público e bibliotecas fechados, as fontes utilizadas têm sido a internet e alguns livros que trazem algumas informações sobre o período em que essas mulheres viveram. Essa tem sido uma dificuldade para a pesquisa. “Conseguir dados e informações sobre algumas personagens tem sido um desafio”, ressalta Marusa.
Para ela, o processo de busca das histórias de vida das heroínas é muito interessante. “Tem sido um processo encantador e de muitas descobertas. Me surpreendi, por exemplo, com a pesquisa sobre Mercedes Baptista, que em 1953 fundou seu próprio grupo de dança batizado como ‘Ballet Folclórico Mercedes Baptista’, onde misturou o estilo clássico com a cultura afro-brasileira”, diz a professora. Sem dúvida alguma, Anita, Benta e Mercedes representaram o empoderamento feminino num período no qual o mundo sequer conhecia essa palavra. E que venham mais heroínas campistas…