Nos últimos anos, a situação do transporte público em Campos dos Goytacazes resulta em uma série de insatisfações. A começar pelos usuários que se queixam da qualidade do serviço. No entanto, há mais gente descontente com o setor. Donos de empresas de ônibus reclamam do transporte alternativo realizado por motoristas de vans, e ainda do transporte ilegal feito por carros piratas. Por outro lado, o governo municipal se queixa do serviço realizado pelos ônibus, pelas vans e pelos piratas. Com a crise das empresas de ônibus, demissões acontecem e o número de passageiros diminui. Empresários afirmam que é a pior fase do transporte coletivo na cidade e que podem falir a qualquer momento. Como resolver os problemas?
Para o empresário José Maria Matias, dono da Viação São João e detentor da concessão pelo Consórcio Planície, em 50 anos, a empresa atravessa o pior momento. Atualmente, há 200 empregados contratados. Outros 200 foram demitidos. Segundo José Maria, o transporte ilegal é o principal problema. “Todo o setor passa por extrema dificuldade financeira. Não há receita suficiente para cobrir os custos de operação, muito menos para investimentos em melhoria”, diz. A frota da São João era formada por quase 120 veículos. Atualmente, foi reduzida consideravelmente, e ainda possui veículos parados dentro da garagem, por falta de demanda em suas linhas. A empresa transportava em torno de 900 mil passageiros por mês. No momento, atende a pouco mais de 300 mil por mês.
A maior reclamação das empresas do setor é a atuação desenfreada e crescente do transporte irregular de passageiros. Para José Maria, “não é combatido de forma eficaz pelo poder público”. A São João ainda não desativou linhas de ônibus, mas reduziu drasticamente horários, principalmente quando há maior quantidade de transporte ilegal. “Apesar de ainda não ter ocorrido, a empresa será obrigada a deixar de atender a algumas localidades por falta de condições financeiras”, revela.
De acordo com Edson Cordeiro, empresário e presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Campos (Setranspas), há uma total defasagem tarifária mantida pelo governo Rafael Diniz e por ter perdido passageiros para o transporte alternativo de vans e o transporte pirata. ” A passagem custa R$2,75 para qualquer localidade de Campos. Deveria valer pelo menos R$3,75. Para locais mais distantes como os distritos da Baixada Campista ou Santo Eduardo, a tarifa deveria valer mais”, explica. O empresário alega que a defasem já dura cinco anos:
“Quando ganhamos a licitação pública em 2013, no edital consta que o transporte de ônibus é de uso exclusivo das concessionárias. Já entramos na Justiça contra a Prefeitura pedindo reajuste de tarifas, e pelo governo estar descumprindo o contrato estabelecido. Deveríamos ter 3,7 mihões de passageiros por mês. Com a crise e transporte ilegal, não passamos de 1,5 milhão de passageiros/mês”, contabiliza.
Dono da Viação Cordeiro que faz parte do Consórcio União, Edson conta que financiou oito novos ônibus, mas vendeu dois para pagar dívidas com fornecedores e indenizações trabalhistas. O banco pode retomar seis veículos por que há atrasos do das prestações do financiamento. “Podemos falir de uma hora pra outra. Dependemos da Justiça e do Governo, mas ninguém se entende. Antes, com o Cartão Cidadão que oferecia passagem social a R$1, as empresas levavam até quatro meses para receberem da Prefeitura, mas pelo menos recebiam. Conseguiam administrar a empresa e manter salários em dia”, lamenta.
O empresário Gilson Menezes, proprietário da Viação Rogil, possui uma frota de 57 veículos e atua no ramo há mais de 30 anos. Ele repete as mesmas queixas dos colegas de segmento. “Há excesso de gratuidade nos ônibus. Se o serviço não era bom, piorou muito nos últimos dois anos pela falta de gestão do poder público. Existem cerca de 300 vans nas linhas das empresas de ônibus. Nossa arrecadação caiu 70%. Isto aponta para uma situação pré-falimentar. O serviço de vans seria para complementar as linhas de ônibus, mas o contrato é descumprido. Há muitos pagantes usando van ou pirata, mas viaja gratuitamente nos ônibus”, critica.
Menezes diz que o setor tenta obter soluções junto à Prefeitura de Campos. Há inúmeros requerimentos, além de ações judiciais contra a Prefeitura. Enfrentamos uma enorme dificuldade para pagar fornecedores e funcionários. O poder público é o principal responsável pela crise no transporte urbano de Campos. Há empresas falindo e insatisfação generalizada entre usuários e trabalhadores”, acusa.
Os empresários do setor de transporte acusam o governo municipal de descumprimento de contrato em relação à permissão do transporte alternativo. “O serviço feito por vans é ilegal no momento. Quando esse tipo de transporte foi autorizado por lei municipal, a lei era bem clara quando diz “O SETAMP tem por finalidade complementar o Sistema de Transporte Público de Passageiros do Município de Campos dos Goytacazes, não podendo suas linhas ser concorrentes ou coincidentes com o serviço convencional,… e dado o caráter complementar do SETAMP (…) é vedada a sobreposição total ou parcial dos seus itinerários com as linhas de ônibus existentes,…” “É vedada a parada e o estacionamento nos pontos utilizados pelos ônibus e microônibus a qualquer título, …”, destacam.
No contrato de prestação de serviço de transporte , a assessoria jurídica do Consórcio Planície destacou: “Fica estabelecido que a Concessionária terá exclusividade na execução dos serviços objeto deste Contrato, não podendo o Poder Concedente contratar outra empresa para a prestação de quaisquer serviços que estejam previstos no escopo da presente concessão, durante a sua vigência”. O empresário José Maria Matias foi categórico: “Esse tipo de concorrência é ilegal e desleal. A solução seria apenas o cumprimento da lei por parte do poder concedente”, frisou.
Nota da Prefeitura
De acordo com o presidente do Instituto Municipal de Trânsito e Transporte (IMTT), Felipe Quintanilha, o transporte público de Campos será modificado, utilizando modelo de integração desenvolvido por sua equipe com o apoio da UFRJ através da Coppe. Ele não informou quando isso ocorrerá. Felipe Quintanilha não comentou sobre as críticas dos consórcios e donos das empresas de ônibus, mas disse que, desde o fim do ano passado, ocorrem operações conjuntas da Guarda Civil Municipal e Polícia Militar para coibir o transporte irregular. Os casos são direcionados para as delegacias da cidade. Dados sobre essas operações, como prisões e apreensões de veículos piratas, não foram divulgados.